Sobre a ingratidão, disse Jesus a Pedro: “em verdade te digo que hoje, nesta noite, antes que duas vezes cante o galo, tu me negarás três vezes.” in Marcos, 14,30.

A INGRATIDÃO NA POLÍTICA
Gaitano Antonaccio

Inspirado no péssimo comportamento de João Dória, Joice, Alexandre Frota, Wilson Witzel e outros políticos pilantras que conseguiram se eleger graças ao apoio do presidente Bolsonaro, nas últimas eleições de 2018, e responderam em seguida, com a mais sórdida ingratidão, resolvi republicar este artigo, escrito em 2002, que diz bem do que representa a Ingratidão na Política.

A ingratidão tem sido um comportamento imperdoável do ser humano, porque o ingrato é um traidor em potencial. Não existe ingratidão sem traição. O homem medíocre jamais perdoa o sucesso de seus semelhantes, nunca retribui favores recebidos de alguém que ama e tem como norma de conduta, não reconhecer o mérito dos que triunfam pelo esforço e pela dedicação. Sente inveja expressa no olhar, nas palavras e gestos, de todos os que alcançam o sucesso e a felicidade. Nunca luta para vencer pelas suas qualidades, mas embaçando ou empanando o brilho das vitórias dos outros. O escritor e político brasileiro, Plínio Salgado, teve o mérito de definir com precisão a figura do traidor, quando escreveu:

O traidor manifesta-se no olhar que não tem luz; na palavra, que é escorregadia e cheia de subentendidos; no gesto, que é equivocado; no sorriso, que é permanente, pois precisa esconder as emoções inconfessáveis.

O tribuno romano Caio Túlio Cícero afirmava: não há quem não deteste o ingrato. Mesmo entre os que possuem cultura, sabedoria e riqueza, a ingratidão e a traição campeiam soltas. Confúcio12 (551-479 a.C.) tornou-se responsável pela criação de um sistema de moral elevada, que exigia como supremacia do caráter, a fidelidade à tradição nacional e à família. Condenava os falsos e ensinava aos seus discípulos, entre os princípios de moral e de civilidade, a seguinte lição: paga a injúria com a justiça, e o bem com o bem.

Ao se ver traído, Demóstenes, na Grécia, foi obrigado a fugir, suicidando-se na cidade de Calauria, usando um estilete envenenado. Tudo porque o poder não perdoava suas ideias de liberdade. Mas, na história da humanidade, nada pode ser comparado à traição sofrida por Júlio César, imperador de Roma, quando foi apunhalado por seus amigos liderados pelo próprio filho adotivo Mário Júnio Bruto (Brutus). E assim tem sido predestinada a vida política de alguns homens, vítimas de ódio, traição e vingança, na trajetória de suas imagens públicas. Alguns, traídos pelos próprios companheiros, como o alferes Tiradentes. Outros, assassinados de forma estúpida e incompreensível como os presidentes Abraham Lincoln e John Fritzgerald Kennedy nos Estados Unidos, Mahatma Ghandi, na Índia; e muitos, levados ao suicídio como ocorreu com Getúlio Dornelles Vargas, no Brasil; Salvador Alende, no Chile e outros estadistas.

Incontestável até hoje nas suas pregações e aceito como unanimidade universal, Cristo jamais foi superado em liderança. Com suas ideias e parábolas, transformou o mundo e criou o cristianismo. Mas foi traído e morto, por um de seus apóstolos. Desde a morte de Cristo, os exemplos de traição e ingratidão repetem-se, mediante as mais ignóbeis formas. O poder tem sido uma força que atrai e corrompe, seduz e embriaga, avilta e destrói o caráter, aniquila a personalidade, escraviza a vontade, tortura a consciência, maltrata o raciocínio, ignora o bem, despreza a solidariedade e faz da soberba o seu agasalho. Na história política brasileira, o tribuno Rui Barbosa, foi traído pelo povo duas vezes sendo derrotado, quando tinha tudo em sua personalidade, para ser o presidente do Brasil.

Ser político, no sentido virtuoso do termo, é construir o bem sem receber as honrarias do benfeitor; é aceitar todas as adversidades como o resultado da soberania popular; é ter as melhores ideias e não vê-las triunfar; assistir às injustiças contra o povo e ter forças para combatê-las, é renunciar ao próprio interesse, para ver consagrados os interesses de todos; é ter espírito público capaz de não negociar os direitos do povo e coragem para denunciar as medidas injustas, que o poder arbitrário arma contra a sociedade, nem sempre cuidadosa para com os seus direitos de cidadania. Maquiavel, em O Príncipe ministrou aulas teóricas de como o homem pode conquistar o poder e conservá-lo. O Indiano Gandhi defendeu seu povo com muita fé, coragem e entusiasmo contra o tratamento hostil dispensado na África do Sul, onde habitavam milhares de indianos. Pelo seu comportamento, começou a receber o castigo por suas pregações, chegando a ser quase linchado no dia 13 de janeiro de 1897, em Durban. Quando os responsáveis foram presos, ele lhes perdoou, alegando que os seus algozes estavam mal informados sobre as suas deias.

Pregando a não-violência, sempre em defesa dos fracos, Mahatma Ghandi foi conquistando adeptos, sua fama alcançou o mundo e todas as suas ideias, repletas de muita inteligência, sabedoria e paz, espalharam-se entre as mais distantes nações. Nas suas orações, muitas máximas ficaram famosas como a citada abaixo:

A não violência é o meu primeiro artigo de fé. É também o último artigo de meu credo. / O ódio mata sempre, o amor não mata nunca. / O amor é a força mais poderosa que possui o mundo, entretanto, ela é a mais humilde que se possa imaginar.

Mahatma Ghandi foi assassinado no dia 30 de janeiro de 1948, na Índia. O ódio que se arrastava entre hindus e muçulmanos não foi contido por ele, que acabou dando sua vida pela paz da humanidade, em troca da ingratidão.

Conselheiro da Fundação Panamazônia, membro da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas – da Academia de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas, da Academia Brasileira de ciências Contábeis, da Academia de Letras do Brasil, da Academia de Letras e Culturas da Amazônia – ALCAMA; correspondente da Academia de Letras do Rio de Janeiro, idem do Instituto Geográfico e Histórico do Espírito Santo e outras.