MANOEL BASTOS LIRA – O INTELECTUAL (PARTE FINAL)

Gaitano Antonaccio*

Quase todo o trabalho literário do farmacêutico Manoel Bastos Lira está voltado para as ciências médicas, mas há que se notar em seus escritos, artigos, livros e publicações diversas, nas entrelinhas das conferências, discursos e outras manifestações pessoais, uma profunda erudição contornada por uma linguagem limpa, firme e segura, revelando um altíssimo cuidado com a sintaxe, com as colocações pronominais, com o estilo e sempre deixando perceber um primoroso método aplicado, a fim de agradar e fazer-se entender por leigos e todos os leitores identificados com a Medicina e seus complicados termos.

Tendo sido um dos alunos da Primeira Universidade fundada no Amazonas, a 17 de janeiro de 1909, sob a denominação de Escola Universitária Livre de Manaus e reconhecida mediante a Lei n° 601, de 8 de outubro de 1909, formou-se farmacêutico pela Faculdade de Farmácia e Odontologia, engajando-se desde então na luta pelo ensino universitário no Amazonas.

Formava, juntamente com os médicos patologistas Djalma da Cunha Batista e Luiz Montenegro, um triunvirato de cientistas e laboratoristas, que se revezava na competência e na concorrência profissional, a serviço da saúde no Amazonas. Além de sua valiosa contribuição com a Santa Casa de Manaus, ele dedicou grande parte de sua vida como responsável pelo Laboratório de Análises Clínicas da Real e Benemérita Sociedade Portuguesa Beneficente do Amazonas, onde fazia exames diuturnamente para os pacientes que o procuravam.

Quando da fundação em 1965, da Universidade Federal do Amazonas, foi convidado para assumir o cargo de diretor da Faculdade de Medicina criada com a Universidade, sempre usando toda a sua competência e habilidade. Sem jamais deixar de ser ligado à área das ciências, ele lutou muito para ver restaurada a Faculdade de Farmácia e Odontologia criada desde 1909., o que finalmente foi conquistado, mediante uma Lei recriando a referida Faculdade. E finalmente, pela Lei nº 4.069, de 12 de junho de 1962, de autoria do senador amazonense, Artur Virgílio Filho foi criada a Universidade Federal do Amazonas, cuja instalação ocorreu em 1965.

Depois de participar da instalação da Universidade, prosseguiu na luta para conseguir um imóvel, a fim de abrigar a sede da Faculdade de Farmácia e Odontologia, mas não era fácil como se poderia imaginar. A Universidade começou a tropeçar em algumas dificuldades, sendo a mais grave, a falta de recursos para implementar suas operações, mas conseguiu alcançar seus objetivos. Todas essas conquistas contaram com a participação decidida do cientista e farmacêutico Dr. Bastos Lira, pois ele conseguiu, a cessão de algumas salas do Plácido Serrano, para ministrar aulas do curso de Farmácia e Odontologia em conjunto com as de Medicina. Nesse período embrionário e sem uma sede própria, o ensino universitário do Amazonas na área de Farmácia, contou com a colaboração do próprio professor Lira lecionando Bioquímica; do professor Afonso Celso Maranhão Nina ministrando aulas de Genética e do Dr. Mário Augusto Pinto de Moraes, mestre responsável pela Cadeira de Anatomia.

Depois de muitas argumentações, os acadêmicos Manoel Bastos Lira e Jauary Marinho, conseguiram com o governador Arthur Reis, a área onde estava sediado o Grupo Escolar Plácido Serrano. Essa atitude do professor Arthur Reis concedeu ao mundo universitário amazonense, uma nova vitória, numa batalha iniciada desde o dia 17 de janeiro de 1909, quando foi criada a Escola Universitária Livre de Manaus, foram concedidas através do Ministério da Educação e Cultura, as verbas para a construção do edifício ao qual se deu o nome de Alfredo da Mata, e nele foi instalada, finalmente, a Faculdade de Farmácia e Odontologia do Amazonas. Outro fato comprovando a dedicação e desprendimento do professor Bastos Lira no sentido de mudar o panorama da saúde no Amazonas, foi o de ter cedido por empréstimo, para a Universidade, todo o seu acervo bibliotecário, farto material fotográfico transformado em slides e equipamentos de uso pessoal, a fim de que nada faltasse nas atividades da Faculdade de Farmácia e Odontologia.

O Amazonas deve a esse cientista notável outras conquistas inominadas, e uma delas pode ser lembrada, quando conseguiu o reconhecimento dos cursos na área na saúde com a ajuda de dois amigos: Dr. Otto Bier, enviado pelo Ministério da Educação e Dr. Tarso Dutra, ambos com o objetivo de inspecionar os cursos de Medicina em primeiro plano, e de Farmácia e Odontologia em seguida. Essa empreitada contou com a participação do odontólogo João Mendes e do farmacêutico Elisário do Couto Bastos.

Mas não se pense que após essas conquistas tudo passaram a ser flores. O Amazonas continua sua luta em busca de melhor aperfeiçoamento no ensino universitário. O Campus da Universidade ainda hoje não abriga todas as Faculdades, aumentando os custos operacionais, dificultando o entrosamento entre alunos e professores de matérias afins, embora aos poucos os espaços venham sendo conquistados como ocorreu, com a inauguração do novo prédio da Faculdade de Direito no Campus Universitário, numa empreitada que contou com a iniciativa do dedicado diretor Dr. José Russo, professor catedrático de Direito Civil da Universidade Federal do Amazonas. E não se pense que a luta cessou, ainda temos muitas conquistas a serem implementadas nos cursos universitários do Estado do Amazonas, e precisamos que outros Manoel Bastos Lira não desapareçam, para o bem de nossa juventude esperançosa num pais inconstante nas suas mais legítimas estruturas sociais, econômicas, educacionais e principalmente voltadas para as liberdades constitucionais.

*Conselheiro da Fundação Panamazônia, membro das Academias de Letras, Ciências e Artes do Amazonas; de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas; Brasileira de ciências Contábeis; de Letras do Brasil; de Letras e Culturas da Amazônia – ALCAMA; correspondente da Academia de Letras do Rio de Janeiro, idem do Instituto Geográfico e Histórico do Espírito Santos e outras.