A Fifa divulgou nesta terça-feira (27) o relatório do investigador norte-americano Michael Garcia, documento responsável por expor a corrupção maciça no alto escalão do futebol mundial. A peça de 360 páginas traz detalhes sobre as suspeitas envolvendo o ex-presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Ricardo Teixeira, que teria usado contratos comerciais da seleção brasileira em 2010 para ocultar o pagamento de propina que ele teria recebido ao apoiar a candidatura do Qatar para sediar a Copa do Mundo de 2022.
Garcia foi contratado pela Fifa para apurar as suspeitas de ilegalidade há cinco anos. O americano, que hoje é juiz em um tribunal de apelação de Nova York, constatou que havia fortes indícios de que o país árabe havia comprado os votos para sediar o evento. Mas, seu informe jamais foi tornado público e, diante da decisão da entidade de engavetar suas descobertas, o investigador pediu demissão em 2014. Desde então, poucos foram processados e o Qatar continuou com o direito de sediar o torneio.
Nesta semana, o jornal alemão Bild teve acesso ao “Relatório Garcia”, e a partir desta terça começaria a revelar os detalhes do processo. A Fifa, porém, optou por se antecipar e, enfim, publicar o relatório em sua integralidade.
Um dos detalhes se refere a como Ricardo Teixeira fez parte do esquema suspeito de compra de votos. Garcia explica como uma partida entre Brasil e a Argentina, realizada no Qatar, pode ter sido usada como forma de camuflar recursos que seriam destinados a pagar Teixeira pelo apoio ao país árabe.
O documento destaca ainda como o Qatar destinou US$ 7 milhões (cerca de R$ 23 milhões, na cotação atual) a Teixeira e ao então presidente da Associação Argentina de Futebol (AFA), Julio Gordona. Naquele momento, porém, o cachê da seleção era de apenas US$ 1,1 milhão (R$ 3,6 milhões).
Quem pagou pelo jogo foi a GSSG, empresa de construção do Qatar que está erguendo as principais obras da Copa do Mundo de 2022. O dinheiro, em seguida, foi enviado à empresa sediada em Zurique, a Swiss Mideast. Um total de US$ 8,6 milhões (R$ 28 milhões) foi dado para a Kentaro organizar o jogo e pagar as duas seleções. A empresa, porém, deu uma comissão de US$ 2 milhões (R$ 6,6 milhões) para uma sociedade de Cingapura, a BCS. O pagamento foi apenas por terem “feito a apresentação” entre as partes envolvidas no jogo.
Mais US$ 2 milhões teriam seguido para a empresa World Eleven, contratada pela Associação de Futebol da Argentina (AFA) para organizar amistosos pelo mundo. O dinheiro, então, seguiria para a entidade esportiva de Buenos Aires, na época presidida por Julio Grondona, um dos que votaram a favor do Qatar.
No caso do Brasil, a Kentaro destinaria um valor inferior, em US$ 1,1 milhão (R$ 3,6 milhões), mais um pagamento extra de US$ 300 mil (R$ 997 mil). O dinheiro foi enviado para a ISE, nas Ilhas Cayman, que depois repassou-o para a CBF.
Para aquele amistoso, o Qatar gastou apenas com a hospedagem de Teixeira mais de US$ 20 mil (R$ 66 mil), cinco vezes o que o governo gastou com Lionel Messi. O brasileiro teve um tratamento de chefe de estado, ocupando uma suíte presidencial.
Os documentos também revelam como Sandro Rosell, ex-presidente do Barcelona, atuaria como intermediário para os interesses do Qatar com as federações sul-americanas, entre elas a CBF. O relatório de Garcia sugere que fosse investigado por corrupção, conflito de interesse e outras violações do código de ética da Fifa.
Ricardo Teixeira ainda voou em um jato privado do Qatar para uma das reuniões e teria dito a interlocutores de outras campanhas de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva “não é nada” e que qualquer decisão do voto do Brasil seria decidida por ele.
Fonte: R7