SÃO PAULO – O Brasil precisa investir R$ 1,1 bilhão por ano, durante os próximos 18 anos, se quiser acabar com a superlotação nos presídios, valor que inclui apenas a construção de novas unidades e reformas nas que estão em más condições. Se contar a compra de equipamentos e o custeio da estrutura ampliada, o montante chega a R$ 5,3 bilhões por ano — ou R$ 95,4 bilhões em 18 anos —, a ser suportado pela União e pelos estados.
A estimativa foi feita pela Secretaria de Controle Externo da Defesa Nacional e da Segurança Pública do Tribunal de Contas da União (TCU).
O custo para a adequação do sistema, contudo, pode ser ainda maior, considerando que o novo governo anuncia planos para aumentar o período dos condenados na prisão, dificultando a progressão de penas. O enfrentamento mais efetivo ao crime organizado também deve pressionar ainda mais as cadeias.
— Não é apenas a questão da corrupção, qualquer criminoso tem que cumprir sua pena de maneira integral. Essa é a nossa política. Se não houver punição ou se a punição for branda, eu acho que é um convite à criminalidade — afirmou, em 30 de novembro, o então presidente eleito Jair Bolsonaro.
Na visão do novo governo, com o endurecimento de regras, haverá redução na prática de crimes, com uma tendência de queda do número de presos no médio prazo.
Hoje a população carcerária cresce em torno de 32 mil por ano. Nos últimos três anos, o governo federal repassou R$ 1,862 bilhão do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) aos estados para investimentos e custeio do sistema penitenciário, mas a realidade prisional do país pouco mudou. Uma fiscalização feita pelo TCU em 11 estados beneficiados e no Distrito Federal mostra que o número de vagas prometidas para obtenção dos recursos, boa parte disponibilizada entre 2016 e 2017, não se materializou.
Das 14.893 vagas compromissadas até o fim de 2018, apenas 996 foram entregues até novembro passado — todas elas em Pernambuco. Com a prorrogação do prazo pelo Ministério da Segurança Pública, outras 2.854 podem ser concluídas até dezembro deste ano, em estados como Ceará, Goiás e Pará. Mesmo assim, o total de vagas criadas até o fim do ano que vem não chegará a um terço do acordado.
Construção mais rápida
Segundo o TCU, os estados não conseguem apresentar projetos no tempo exigido pela legislação. O prazo entre planejar uma unidade prisional e entregá-la pronta chega a quatro anos. Para acelerar a construção de presídios, o governo de Bolsonaro, por meio do Ministério da Justiça, estuda fornecer projetos prontos para os estados, que ficariam incumbidos apenas de tocar a obra. Segundo dados do TCU, a construção de cada vaga em presídio custa, em média, cerca de R$ 49 mil.
Hoje, os estados solicitam a verba do Funpen apenas informando a quantidade de vagas que pretendem abrir. Só depois vão atrás dos projetos de engenharia e até do local onde o presídio será erguido.
Estados que não conseguiram usar a verba do Funpen, como Bahia e Mato Grosso do Sul, por exemplo, estão com seus presídios superlotados. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança, a população carcerária nos dois estados é mais que o dobro do número de vagas.
A superlotação aumenta a tensão nas penitenciárias, muitas delas dominadas por facções criminosas.
— A situação já é muito ruim. Em presídios superlotados, o risco de rebeliões é mais alto — diz Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
No Rio Grande do Norte, a Penitenciária Estadual de Alcaçuz, onde 26 presos morreram em janeiro de 2017, teve suas instalações reconstruídas, mas a superlotação continua.
Segundo Thadeu Brandão, do Observatório da Violência do Rio Grande do Norte, da Universidade Federal Rural do Semiárido, na época da rebelião a penitenciária estava com 1.500 presos. Hoje, tem perto de 2 mil para uma capacidade de 800 vagas.
— A situação é de extrema preocupação. Com a superlotação, qualquer tentativa de rebelião resulta em perda de controle — diz Brandão, que complementa: — Os presídios brasileiros estão há pelo menos duas décadas sob o controle de facções e vamos entrar na terceira. Temos fábrica de marginalidade. É preciso repensar o modelo, não podemos encher com pequenos delinquentes que vão se tornar operários dos traficantes.
O Rio Grande do Norte construiu uma cadeia com 603 vagas em Ceará Mirim, perto de Natal. O presídio, porém, não entrou em funcionamento. Faltam recursos para pessoal e equipamentos.
Fonte: O Globo