WASHINGTON — O relatório do procurador especial Robert Mueller sobre o papel da Rússia nas eleições de 2016 nos Estados Unidos, divulgado na quinta-feira, detalha diversos esforços do presidente Donald Trump para frustrar uma investigação federal, dando aos democratas munição política contra o republicano. Mas, dentro do partido, não há consenso sobre como usá-lo.
O documento de 448 páginas mostra claramente como Trump tentou impedir a investigação, mas não concluiu que o presidente tenha cometido o crime de obstrução da justiça. Com isso, Mueller deu ao Congresso o poder de determinar se o republicano infringiu ou não a lei.
A maioria dos líderes do Partido Democrata se recusaram a levantar a possibilidade de abrir um processo de impeachment, a apenas 18 meses das eleições presidenciais de 2020. Foi exceção, entretanto, a senadora e pré-candidata presidencial Elizabeth Warren, que disse:
— O relatório de Mueller apresenta fatos que mostram que um governo estrangeiro hostial atacou nossas eleições em 2016 para ajudar Donald Trump, e Donald Trump deu as boas-vindas a esta ajuda — disse. — Uma vez eleito, Donald Trump obstruiu a investigação sobre este ataque. Isso implica que o Congresso deveria iniciar um processo de destituição contra o presidente dos EUA.
A ideia foi também abraçada por alguns importantes membros da ala progressista do Partido, como a congressista Alexandria Ocasio-Cortez:
“Muitos sabem que não me agradam discussões sobre impeachment. Não fiz campanha sobre isso e raramente discuti o tema de forma espontânea”, escreveu ela no Twitter. “Mas o relatório coloca isso diretamente na nossa porta.”
Qualquer tentativa de acusar o presidente teria início na Câmara dos Representantes, liderada pelos democratas. Mas a saída de Trump exigiria o apoio do Senado, de maioria republicana, e, por isso, parece improvável. O líder democrata na Câmara, Steny Hoyer, aconselhou a não tentar destituir Trump agora.
— Com base no que vimos até agora, avançar um impeachment não vale a pena neste momento. Francamente, há uma eleição em 18 meses e o povo americano fará um julgamento — disse Hoyer à CNN.
E o próprio presidente do partido, Tom Pérez, deixou no ar uma possível retaliação:
— Donald Trump passou todo o mandato envolvido em uma campanha contínua de obstrução, intimidação e abuso de poder. Ninguém está acima da lei.
Os membros do alto escalão democrata fazem também uma ofensiva para obter o relatório de Mueller completo, sem edições. Nesta sexta, rejeitaram na Câmara dos Deputados e no Senado a proposta do procurador-geral de Trump, William Barr, para que fosse disponibilizada aos legisladores apenas uma versão menos editada do que aquela divulgada ao público na quinta-feira.
Numa carta assinada por seis democratas de peso, incluindo a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e o líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer, reiteraram a sua demanda pela íntegra do relatório. Ressalvaram, contudo, que estavam abertos a discutir um “acordo razoável” com o Departamento de Justiça.
O presidente da Comissão de Justiça da Câmara dos Representantes, o democrata Jerrold Nadler, pediu ainda ao procurador especial Mueller para testemunhar perante o painel antes de 23 de maio.
‘Louco Relatório Mueller’
Nesta sexta-feira, Trump voltou a comentar o documento no Twitter e denunciou “testemunhos fabricados” no relatório do procurador especial: “Algumas pessoas fazem declarações sobre mim no Louco Relatório Mueller, escrito por 18 Irritados Democratas Odiadores de Trump, que são fabricadas e totalmente falsas”, escreveu o presidente.
E acrescentou, repetindo que a investigação foi “um erro ilegalmente iniciado”: “Devido ao fato de que nunca aceitei testemunhar, não foi necessário responder às declarações feitas no ‘Relatório’ sobre mim. Algumas delas são uma completa bobagem, e só foram dadas para fazer a outra pessoa ficar bem (ou eu ficar mal)”.
Trump conta com o apoio do seu Partido Republicano na contestação ao relatório e à “má interpretação” democrata. Foi o que disse Doug Collins, principal legislador republicano na Comissão de Justiça da Câmara dos Representantes, que acusou a oposição de fazer uma leitura errada da seção do relatório sobre a obstrução de justiça para se adequar à sua agenda contra Trump.:
“Parece haver uma certa confusão. Esta não é uma questão de interpretação legal, é de compreensão de leitura. O relatório não diz que o Congresso deve investigar a obstrução agora”, defendeu Collins numa rede social.
Fonte: O Globo