A Petrobras anunciou, nesta segunda-feira (5/7), novo reajuste nos combustíveis e do gás de cozinha nas refinarias, levando analistas a revisar novamente para cima as projeções de inflação para julho e no fim do ano. De acordo com especialistas, devido à recente alta de 52% no valor das bandeiras tarifárias da conta de luz, a energia será o grande vilão da inflação de julho e do ano, especialmente se as chuvas aguardadas a partir de outubro não ajudarem a melhorar o nível dos reservatórios e a conter a alta no custo de vida, que não está dando sinais de trégua.
Os novos valores entram em vigor nesta terça-feira (6/7). Em comunicado, a estatal informou que o aumento dos preços acompanhou a elevação dos patamares internacionais. Assim, os valores médios de venda do litro da gasolina e do diesel serão reajustados em 6,3% e 3,7%, ou R$ 0,16 e R$ 0,10 o litro, respectivamente, para R$ 2,69 e R$ 2,81. Enquanto isso, o preço médio de venda do gás de cozinha para as distribuidoras sofrerá reajuste de 5,9%, ou R$ 0,20 o quilo, para R$ 3,60 o quilo. Ou seja, um botijão de 13 quilos passará a custar R$ 46,68 para as revendas e acumula alta de 38% no ano.
Esse é o primeiro aumento nos preços da gasolina e do diesel na gestão do general Joaquim Silva e Luna, que substituiu Roberto Castello Branco em abril. “Os preços praticados pela Petrobras seguem buscando o equilíbrio com o mercado internacional e acompanham as variações do valor dos produtos e da taxa de câmbio, para cima e para baixo”, informou a nota da estatal.
Em 18 de fevereiro, insatisfeito com a política de reajuste adotada por Castello Branco, o presidente Jair Bolsonaro reclamou em uma rede social. “Teve um aumento, no meu entender, e vou criticar, um aumento fora da curva da Petrobras. Dez por cento hoje na gasolina e 15% no diesel, é o quarto reajuste no ano. A bronca sempre vem para cima de mim, só que a Petrobras tem autonomia”, disse. No dia seguinte, em 19 de fevereiro, Castello Branco foi demitido.
O reajuste anunciado ontem pela Petrobras teve repercussão imediata. Analistas que previam, no boletim Focus do Banco Central desta semana, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a 6%, admitem que estão revendo os números. Espera-se uma nova estimativa para cima. Alguns não descartam o IPCA acima de 7% no fim do ano e de 9% no acumulado em 12 meses de julho após acharem que o pico seria em junho, de 8%, nessa base de comparação.
“A gasolina e o gás de cozinha têm um peso importante no orçamento doméstico. Esses reajustes, junto com o aumento da energia, terão um impacto de mais 0,5 ponto percentual no IPCA de julho. Eu diria que este mês os vilões serão os itens energéticos, que vão ditar a inflação deste mês e podem encerrar em alta até o fim do ano”, avaliou o economista André Braz, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas. O FGV Ibre elevou de 0,5% para 1% a estimativa de alta do IPCA deste mês e pretende elevar de 7% para 7,4% a estimativa de alta do IPCA no fim do ano. “O recuo no preço da energia, que está no patamar mais alto, a bandeira vermelha 2, vai depender do volume de chuvas a partir de outubro”, emendou.
Preço defasado
Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o reajuste da Petrobras deu uma má sinalização para o consumidor, que vai pagar mais caro pelos combustíveis, mas foi positivo para o mercado, porque afastou o risco de intervenção no momento em que há muita tensão no governo, com a popularidade em queda. “Havia uma grande dúvida se o presidente Jair Bolsonaro iria interferir na nova política de preços da Petrobras após trocar o comando da estatal e impedir que os reajustes ocorressem no mesmo mês em que houve forte alta nos preços da energia elétrica”, afirmou. “Foi um reajuste corajoso e que vai na direção de manter a autonomia da Petrobras na política de preços”, acrescentou Pires.
De acordo com o especialista em infraestrutura, o reajuste na gasolina anunciado ontem reduziu parcialmente a defasagem do preço da gasolina no mercado interno em relação ao internacional, de 14% para 7%. E, no caso do diesel, ainda há uma defasagem em torno de 3%. A recente valorização do real frente ao dólar, que chegou a ficar abaixo de R$ 5, nos últimos dias, evitou que esse reajuste fosse maior. “Mas é provável que, como a tendência lá fora é de que o preço do barril do petróleo continue subindo, a Petrobras poderá fazer um novo reajuste em agosto para corrigir a defasagem”, explicou Pires. Ele reconheceu que a gasolina e a energia elétrica deverão ser os grandes vilões do IPCA deste ano.
O mercado pode respirar aliviado, mas o consumidor reclama. “Acho um absurdo aumentar os combustíveis em plena pandemia, quando a maioria brasileiros hoje precisam do seu veículo por estar na pandemia, evitar aglomeração de transporte público”, criticou o policial militar Danilo Ferreira, 37 anos. “É totalmente desproporcional à realidade atual que vivemos. O aumento no óleo diesel vai impactar de forma mais drástica os preços de produtos nos supermercados, como os alimentos”, acrescentou Ferreira, morador de Valparaíso. O mecânico Pedro Henrique Marques, 24 anos, engrossa o coro de protestos. “Acho muito errado o fato de ter tanto aumento na gasolina. Para muitas pessoas, o carro é um meio de trabalho, e, com isso, o aumento do combustível afeta diretamente a população”, destacou o morador de Santa Maria.
Categorias criticam reajuste
O primeiro reajuste de combustíveis da gestão do general Joaquim Silva e Luna na Petrobras pegou os caminhoneiros de surpresa. Há menos de uma semana, membros do Conselho Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas (CNTRC) se reuniram com o presidente da estatal e pediram para que o preço do diesel não subisse. “Deixamos claro, na reunião, que se o diesel subisse, ia afetar seriamente não só os caminhoneiros, mas a sociedade em geral, que já está muito pressionada”, disse Plínio Nestor Dias, presidente do CNTRC.
A alta do diesel afeta toda a cadeia produtiva, que depende do frete rodoviário para distribuição no país. Dias afirmou que a greve dos caminhoneiros, marcada para o próximo dia 25 de julho, continua de pé e ganha força com a alta. Segundo ele, o CNTRC enviará uma carta à Petrobras, reafirmando a posição da categoria. “Vamos traçar nossa estratégia para ninguém sair prejudicado, mas vai ter greve”, disse o representante dos caminhoneiros.
Os petroleiros também criticaram. Segundo o coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, o aumento veio da pressão de importadores de combustíveis e de investidores do mercado financeiro. “É mais uma clara demonstração da equivocada política de preço de paridade de importação (PPI), adotada pelo governo Bolsonaro contra a população brasileira e que penaliza, sobretudo, os mais pobres”, criticou o sindicalista.
Bacelar chama a atenção sobre o impacto que os aumentos terão na inflação em efeito cascata, que, junto com a elevação das tarifas de energia elétrica, achatam a renda do trabalhador. “É inadmissível que, com este novo aumento no gás de cozinha nas refinarias da Petrobras, a partir desta terça-feira, o sexto aumento somente neste ano, o gás de cozinha já acumule uma alta de 37,9%”, ressaltou Bacelar.
Ele destacou que nos últimos 12 meses, o IPCA acumula alta de 8,06%. “Ou seja, em sete meses, o aumento do gás de cozinha já é quase cinco vezes a inflação de um período de um ano”, disse.
Fonte: Correio Braziliense