O Uruguai ainda não definiu seus candidatos à Presidência para as eleições do próximo mês de outubro, mas ela tem ampliado sua popularidade e conta com uma carta de apresentação forte: é a preferida do ex-presidente José “Pepe” Mujica (2010-2015). Será uma das protagonistas das eleições internas da governista Frente Ampla, no poder desde 2005, e se for eleita será a primeira mulher a governar o Uruguai. Ex-ministra da Indústria e Energia, a engenheira Carolina Cosse foi uma das dirigentes políticas que participaram da marcha em defesa das recentes decisões adotadas pelo presidente Tabaré Vázquez no conflito com as Forças Armadas.
Em entrevista exclusiva ao GLOBO, Carolina assegurou que setores e militares como os que acobertaram ex-repressores “são poucos, nostálgicos e têm os dias contados”. A pré-candidata definiu-se como uma feminista e assegurou que, se chegar ao poder, implementará medidas contundentes para combater a violência de gênero. “Os homens têm um mundo pior se as mulheres não ocupam o lugar que devem ocupar”, enfatizou a candidata de Mujica.
A senhora esteve na manifestação de apoio ao presidente. Qual é sua avaliação sobre o conflito entre Executivo e Forças Armadas envolvendo crimes da última ditadura?
A marcha desta quinta (ontem) era para dar respaldo explicito às medidas adotadas pelo presidente e revisar conceitos que nos unem na defesa da democracia e da verdade. Este fato doloroso (o acobertamento de ex-repressores) que levou à destituição de seis generais de alguma maneira nos uniu e colocou sobre a mesa temas importantes. Os militares democratas podem visualizar que têm a oportunidade de limpar a instituição. Porque as instituições devem ser respeitadas por dentro e por fora. A lógica corporativa deve sempre estar subordinada à defesa da democracia e da Constituição. (É preciso ter) Cuidado com os militares que se confundem e pensam que estão fazendo a coisa certa quando, na verdade, estão aplicando uma lógica corporativa que nada tem a ver com a lógica da instituição em jogo. Para o resto da sociedade, ficou claro o caminho da verdade e que esse caminho nunca termina. Voltam temas dolorosos, esses depoimentos (de ex-repressores) de alguma maneira alertaram sobre a importância de estarmos atentos sempre. Falamos muito sobre a construção de nossos valores, da deterioração de valores. Eu me pergunto, daqui a 30 anos quando as crianças lerem sobre nossa História, quando a estudarem, que valores vamos mostrar a eles, que valores teremos construído se tivermos escondido a verdade?
Este conflito era necessário, de alguma maneira?
Ele mostrou a importância de percorrer caminhos de integração. Não podemos isolar as Forças Armadas, elas têm um papel e a maioria de seus membros nada tem a ver com a ditadura. A maioria não gosta do que aconteceu. Não podemos isolar os militares e todos devem entender e amadurecer na compreensão de sua função. O caminho da verdade é o único possível. Todo o Uruguai respalda o presidente e reconhece que as Forças Armadas devem estar a serviço da democracia. O resto são poucos e nostálgicos que têm os dias contados.
A senhora é a única mulher na campanha presidencial…
Sim, me vejo com chances e quero ajudar a Frente Ampla a ganhar a eleição.
O ex-presidente Mujica é um apoio forte…
É um apoio que me enche de orgulho. Mas também tenho o respaldo de outros setores e do povo, cada vez mais. O Uruguai quer ter uma presidente mulher, sinto isso nas ruas.
Quais são suas principais propostas de governo?
A Frente Ampla tem um programa único, e dentro dessa proposta incluí projetos sobre segurança, a utilização das vantagens competitivas do Uruguai e sobre medidas anticíclicas para melhorar o mercado de trabalho, por exemplo.
Quero um governo de cabeça aberta e pensamento diferente. Em relação às mulheres, me comprometi com movimentos feministas do Uruguai a fazer todos os esforços para cumprir a lei de violência de gênero, que é uma infâmia social. Temos de desmontar os cenários de violência de gênero para que as crianças se criem em ambientes de paz e as mulheres jovens possam ser livres. Dar mais oportunidades às mulheres não é positivo só para as mulheres, beneficia a todos. Os homens têm um mundo pior se não ocupamos nosso lugar. Nós fazemos um mundo melhor.
Como a senhora avalia o crescimento e fortalecimento do feminismo no mundo?
Bem, sou feminista e acho que é saudável que existam movimentos que reivindiquem a igualdade. Mas tudo deve ser num marco de convivência pacífica, porque precisamos de um mundo melhor para todos. As mulheres jovens estão aí com suas demandas e elas têm direito a ganhar novos espaços e direitos. Devemos isso a elas.
Fonte: : O Globo