CARACAS E MADRI – Diálogo? Invasão militar? Após a avalanche de eventos do último mês, muitos se perguntam qual será o desfecho da crise venezuelana.
O reconhecimento de cerca de 40 países a Juan Guaidó como presidente interino, seu amplo apoio popular e o embargo contra o petróleo venezuelano dos Estados Unidos fecharam o cerco ao presidente Nicolás Maduro, mas isso por si só não significa a sua queda.
Maduro ainda detém o apoio de líderes militares e de aliados como a Rússia e a China, que mantêm importantes investimentos no país, assim como o controle institucional.
Segundo especialistas, quatro cenários são mais prováveis para a crise.
Negociação
Maduro a defende vagamente, enquanto Guaidó afirma que qualquer diálogo deve levar à saída do governante socialista. Segundo o presidente da Assembleia Nacional, Maduro procura se perpetuar no poder, promovendo falsas negociações.
Nesta quinta-feira, oito países europeus e cinco latino-americanos vão discutir uma solução pacífica, em uma reunião em Montevidéu.
— [Negociar] parece muito improvável, a menos que o Exército se separe Maduro e coloque outro interlocutor — disse Anna Ayuso, especialista em América Latina do Centro de Estudos Internacionais Cidob, em Barcelona.
A pedido de Maduro, o Papa Francisco afirmou na terça-feira que está disposto a mediar uma solução, se as duas partes o solicitarem.
— Maduro poderia aceitar uma negociação em troca da suspensão de embargos e de não sofrer perseguição internacional — diz o cientista político Ernesto Pascual, da Universidade Aberta da Catalunha.
Invasão estrangeira
Primeiro país a reconhecer Guaidó, os Estados Unidos afirmaram várias vezes que não descartam uma ação militar, embora até agora tenham optado pelo “colapso econômico para desestabilizar” Maduro, segundo o analista Luis Vicente León.
Especialistas acreditam que o gatilho poderia ser uma ação armada do governo contra a ajuda humanitária de alimentos e remédios que os EUA e Guaidó planejam distribuir no país, entrando a partir de Brasil e Colômbia.
Maduro diz que esta “ajuda humanitária” é na verdade o início de uma intervenção militar. Especialistas discordam:
— Não acho que seja do interesse dos Estados Unidos, nem da Colômbia e nem do Brasil se envolverem em um conflito — disse Anna Ayuso.
Uma invasão não teria consenso internacional, depois das dificuldades para se impor democracias liberais por meios militares no Iraque e no Afeganistão, observou Pascual.
León acredita que Maduro evitaria o uso da força para impedir a entrada de ajuda. Também adverte que uma intervenção poderia desencadear uma violência anárquica por parte de grupos civis armados pró-governo, como na Líbia e na Síria.
— Talvez esses grupos se pulverizem, mas o risco existe — acrescenta ele.
Implosão
Para os analistas, os militares continuam a ser o fator determinante para o futuro do impasse. Embora fissuras tenham aparecido nas Forças Armadas, o alto comando continua fiel a Maduro.
— Um colapso interno exige que os militares e os chavistas se separem. Seria o fim da revolução — observa León.
Pascual sustenta que, embora os militares “não declarem suas intenções até o último momento”, é “improvável” que eles abandonem Maduro “por causa dos interesses que as lideranças têm nas áreas de petróleo e mineração”.
Para quebrar esse apoio, Guaidó, o chefe do Parlamento, está promovendo uma lei de anistia para membros das Forças Armadas que renegarem o regime de Maduro, exceto no caso de crimes contra a humanidade.
Apesar disso, quase um mês depois de lançar a proposta, não houve deserção nos altos escalões do Exército, à exceção de um solitário general , entre mais de 600. Documentos revelam que o governo luta para contê-las, mas pouco se sabe a este respeito. Segundo León, a proposta da Assembleia Nacional é vista com descrédito e como vaga de mais.
— Uma implosão ocorre quando os atores percebem que receberam alguma garantia para a sua proteção, patrimônio e liberdade — afirmou ele, acrescentando que isto ainda está “em estado germinal” e que a oferta ainda é vaga. — O setor militar precisa de uma negociação cara-a-cara, de um acordo com nome e sobrenome, um fiador internacional e, provavelmente, do perdão constitucionalizado.
Endurecimento
Maduro poderia se entrincheirar e fechar fileiras ao “estilo cubano”, diz Ayuso, com “conseqüências muito dolorosas” para uma população devastada pela escassez de itens básicos de vida e pela hiperinflação, que o FMI projeta em 10.000.000% para este ano.
O país, que obtém 96% de suas receitas do petróleo, deve procurar mercados para cerca de 500 mil barris diários que está exportando para os Estados Unidos, metade de sua produção e 75% de seu fluxo de caixa.
— Este é um cenário terrível, porque não resolve o problema e piora o país — diz León.
Além disso, em sua nova fase, a repressão contra adversários seria aberta e mais dura, “a caminho de um governo militar puro e duro”, afirma Ayuso.
Fonte: Secom