A área de tombamento do Centro Histórico de Manaus, protegido nacionalmente desde 2012, tendo como foco o espírito da Belle Époque, não é uniforme, tem particulares e configurações únicas. Esse é um dos conceitos na nova norma do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) Amazonas para a região, em cooperação inédita com a Prefeitura de Manaus e o Governo do Estado. Via Instituto Municipal de Planejamento Urbano (Implurb), a minuta recebeu contribuições técnicas para sua finalização.
Diretoria e técnicos do Implurb participam da construção colaborativa da minuta do Iphan-AM, com os atributos de valor paisagístico, elementos estruturais do bem cultural e diretrizes de preservação do Centro Histórico.
“A Prefeitura de Manaus se debruça no dia a dia das autorizações, vivencia as dificuldades tanto do projetista quanto de análises internas, mas tem a vantagem de ter feito exercícios no Centro Histórico, sentindo as necessidades reais”, diz a superintendente do Iphan-AM, Karla Bittar.
A normativa pretende mostrar e detalhar que o Centro Histórico tem configurações distintas, mesmo quando se está em uma mesma avenida com todas suas referências. “Um exemplo muito claro é a avenida Sete de Setembro, que tem larguras de vias diferentes, gabaritos variados. É isso que estamos traduzindo, com clareza, no documento”, disse Bittar.
A ideia é focar igualmente nas potencialidades da área, do que é permitido, no sentido de dar ao Centro maior vivacidade e fomento ao desenvolvimento e implantação de atividades em áreas públicas e do setor privado, em comércio, habitação, serviços, arte e cultura.
“O Centro Histórico precisa ser visto como um todo. Nenhum parâmetro isolado vai resolver sua preservação. É um conjunto de diretrizes, do que é permitido e do que é necessário para manter seus valores e referências”.
Contribuições
Para o diretor de Planejamento do Implurb, arquiteto e urbanista Pedro Paulo Cordeiro, as contribuições feitas à minuta levam em consideração a legislação municipal em vigor, como o Plano Diretor de Manaus e a Lei Orgânica do Município (Loman), além do Decreto 7.176/2004, que estabelece as unidades de interesse de preservação – são 1.656 imóveis/lotes, 11 do conjunto orla portuária e mais 10 praças históricas.
“As contribuições técnicas giram também em torno de diversas intervenções propostas pelo prefeito David Almeida, dentro do projeto ‘Nosso Centro’, iniciando pela Ilha de São Vicente. É importante o alinhamento e entendimento das esferas do poder público para desenvolver a reabilitação da região, sem uma legislação que engesse”, comentou o arquiteto.
O diretor lembra que empreendedores que querem investir no bairro, de maneira responsável, oficial, dando entrada em projetos, vão contar com uma norma moderna e mais sustentável, menos engessada que a anterior, contribuindo para a reabilitação do espaço urbano.
Um dos paradigmas que se busca quebrar é a ideia errônea de que não se pode mexer em imóveis de interesse de preservação. “Pode sim, mas existem critérios que já foram mostrados em outros exemplares, em obras públicas ou particulares. É possível reutilizar, fazer reuso e adaptar às necessidades presentes, desde que atendendo à legislação e às normas. Não é porque um imóvel é habitacional, no passado, que só poderá exercer este uso hoje. Pode ser pensado para uma cafeteria, hostel ou habitação multifamiliar”, disse, lembrando que a norma em construção busca facilitar esse novo olhar sobre o Centro, mudando rotina e o território, ocupando o mesmo com empreendimentos públicos e privados.
Entre as contribuições apresentadas pelo Implurb, por exemplo, estão critérios referentes a marquises e coberturas; detalhes sobre arborização e altura proposta para não impedir a visão de fachadas e monumentos; criar mapas temáticos e tabelas para setores e eixos com função de facilitar análise, entre outros.
Tombamento
Em julho deste ano, foi publicada a homologação do tombamento do Centro Histórico de Manaus. O ato administrativo representa a chancela, pelo Ministério do Turismo, das decisões tomadas nas fases anteriores do processo de reconhecimento do conjunto urbano, protegido pelo Iphan desde 2012.
Agora, o espaço será inscrito em dois dos quatro livros do tombo (onde são registrados os bens culturais), concluindo, assim, o processo de tombamento: o Histórico, formado por bens cuja conservação seja de interesse público por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil; e o Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, que reconhece bens relacionados a vestígios da ocupação humana pré-histórica ou histórica, de referência para determinados grupos sociais e que engloba tanto áreas naturais, quanto lugares criados pelo homem aos quais é atribuído valor a sua configuração paisagística, como jardins, cidades ou conjuntos arquitetônicos.
O local protegido pelo Iphan abrange uma área entre a orla do rio Negro e o entorno do Teatro Amazonas. Os monumentos presentes no Centro Histórico de Manaus refletem o espírito da Belle Époque, quando a capital amazonense era conhecida como uma das metrópoles da borracha. No auge do ciclo do produto, o Brasil exportou 42 mil toneladas do insumo em um único ano, dinheiro que financiou boa parte do conjunto urbano.
Normativa
Desde o início do ano, o Implurb trabalha de forma bastante alinhada com o Iphan nas tratativas para o Centro Histórico, incluindo os projetos do “Nosso Centro”, que visam a 38 intervenções para o espaço na gestão do prefeito David Almeida.
Durante décadas as leis das três esferas – federal, estadual e municipal – não convergiam e não se conversavam, causando atrito em licenciamentos e aprovações por divergências nas normas.
“Com esse alinhamento, inicialmente com a nova normativa do Iphan, posteriormente tendo a reestruturação de uma legislação municipal, vai facilitar muita coisa. A construção coletiva é uma quebra de paradigma. Nunca tivemos isso e hoje cada órgão que fez parte do processo tem o pertencimento da lei, o que facilitará sua implementação”, disse Cordeiro.
Os trabalhos do “Nosso Centro” são concentrados na Comissão Técnica para Implementação e Revitalização do Centro Histórico de Manaus. A comissão é formada pela Secretaria Municipal de Finanças e Tecnologia da Informação (Semef), Secretaria Municipal do Trabalho, Empreendedorismo e Inovação (Semtepi), e Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (Manauscult), e tem coordenação do Implurb.
Junto ao Iphan, a Prefeitura de Manaus vem mantendo intenso alinhamento para a construção de um sistema de gestão compartilhado, que possa dar mais proatividade e auxiliar no destravamento burocrático, cada um na sua devida responsabilidade técnica e legal, respeitando as competências.