Oficinas levam comunidades a pensar produtos de comunicação em favor da saúde pública

Roteiros, vídeos, flyers, podcasts, rodas de conversa, faixas, cartazes, repentes e paródias nasceram a partir das estratégias e necessidades de saúde das comunidades ribeirinhas, quilombolas e de migrantes por meio do Projeto Amazônia Solidária

A comunidade ribeirinha de Novo Paraíso, localizada na zona rural do município de Tabatinga, no Alto Solimões, sofre há tempos com o isolamento e as condições precárias de mobilidade. Os ramais intrafegáveis que levam até a localidade dão a exata dimensão do que é viver e sobreviver num lugar onde a agricultura familiar é a principal fonte de economia e o acesso aos serviços de saúde é limitado. Para essa população ribeirinha, as oficinas do Projeto Amazônia Solidária, foram mais do que encontros de capacitação. As atividades são desenvolvidas pela Fiocruz Amazônia e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), com apoio da NPI Expand, Fiotec, SITAWI Finanças para o Bem e Conselho de Secretários de Saúde do Amazonas (Cosems-AM) com o objetivo de identificar fatores que impactam no aumento da cobertura vacinal nos territórios, e permitir a formulação de estratégias por meio da participação social e metodologias da Educação Popular em Saúde para melhorar a comunicação e divulgação cientificas a partir dos atores sociais da comunidade.

Denise Amorim, publicitária e mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz, explica que pensar comunicação é importante, porque a população não tem atendido ao chamado das campanhas de vacinação oficiais, seja por preconceito, seja por conta das fakenews. “Com o projeto conseguimos trazer essa temática para dentro de uma comunidade rural ribeirinha no interior do Amazonas, com produtos de comunicação que nasceram a partir das estratégias e das necessidades do território”, afirma.

As atividades representaram oportunidades de superação e descobertas para comunitários como o agricultor Arlindo Ribeiro dos Santos, 72, que, pela primeira vez na vida, atuou como um apresentador entrevistando o estudante de Medicina, Lucas Matheus Correia, 23, sobre os benefícios e dúvidas acerca das vacinas. Assim como Arlindo, que venceu a timidez e conseguiu realizar sua entrevista, o projeto revelou o talento do agricultor Francisco Sales Barbosa, 76, para a arte do repente. Expert na arte do improviso com os versos, Francisco vive do que planta em seu pedaço de chão. Apesar de analfabeto, é um mestre no uso das palavras que brotam de sua poesia. “Nasci com esse dom e gosto de cantar para ver as pessoas felizes”, resume Francisco, que foi responsável pela elaboração de um roteiro de vídeo com repente sobre vacinação, junto com grupo da oficina.

“Seja um podcast, seja um vídeo mais simples, seja uma roda de conversa, atividade educativa, estamos falando das linguagens da comunicação que transversalizam com a linguagem da educação, então essa é a importância, a gente não consegue mobilizar o território se a gente não fizer uma efetiva comunicação para além do oficial governamental, daí a importância do projeto em estimular as comunidades e as equipes de saúde a produzirem esses conteúdos”, avalia Denise.

Segundo ela, o projeto foi uma oportunidade de resgate da Política Nacional de Educação Popular em Saúde, que preconiza metodologias participativas que inserem a comunidade e os atores sociais. “Construímos o termo de referência dessa oficina por meio dos círculos de cultura, que são os passos agregadores de diálogo e de construção participativa, de aprendizado coletivo. Com o Amazônia Solidária, foi possível experimentar essa metodologia nos municípios, atendendo plenamente aos propósitos do projeto”, salienta a facilitadora.

Ela complementa: “O projeto conseguiu promover a aproximação entre as equipes de saúde e as comunidades, seja no contexto urbano, contexto rural, ribeirinho, quilombola, com resultados excelentes tanto para oficina 1 quanto para a oficina 2. Foi fantástico vê-los desenhando e pensando seus territórios, lendo e discutindo informações sobre vacinação e o que foi a COVID-19, o medo, os preconceitos, as fakenews, e depois disso promover, na oficina 2, os produtos de comunicação, que foi um exercício novo, tanto para a comunidade, quanto para as equipes de saúde do município, que não estão preparadas para pensar a comunicação sob esse ponto de vista que nós trouxemos”, observa Amorim.

Para o enfermeiro Jackson Miller Moreira, 26, da equipe de Atenção Básica, da Secretaria Municipal de Saúde de Tabatinga, participar da oficina foi um exercício inédito. “Foi muito interessante pensar roteiros, pensar em pequenas gravações de podcasts para utilizar nos grupos de whatsapp na comunidade”, afirma. O enfermeiro diz colocar em prática algumas estratégias de comunicação, a exemplo de faixas e cartazes explicativos, mas não imaginava que poderia ir muito mais além com dramatizações, panfletos, grupos de whatsapp, entre outros recursos que motivam tanto os profissionais de saúde quanto o público-alvo, que são os comunitários.

A oficina 2 encerrou o projeto, mas o legado ficará com resultados que poderão ser observados a longo prazo. O estudante de Medicina da UEA, Lucas Correia, é um dos que acreditam na eficiência da comunicação em Saúde. Ele participou da oficina durante o seu estágio rural em Saúde Coletiva, em Tabatinga, para conhecer a realidade do município. “Estar aqui é uma experiência muito transformadora. O conhecimento vai muito além do que a medicina nos ensina. Estamos aqui para unir esse conhecimento que a Medicina nos traz de dentro da universidade para as pessoas que precisam desse atendimento e o processo de educação em saúde é muito importante porque ele é o pilar de tudo na Atenção Primária”, destacou.

Lucas participou ativamente da oficina na comunidade Novo Paraíso e considerou a atividade uma oportunidade a mais para falar sobre prevenção. “Vacina é excelente para que possamos evitar complicações futuras e todos nós precisamos falar sobre isso, sempre. Essa ação que está ocorrendo aqui é muito importante. O ato de se comunicar hoje em dia é a base de tudo, toda vez que pudermos divulgar uma ação em saúde contem conosco, principalmente se for para melhorar o atendimento vacinal nas áreas mais distantes e remotas do interior do Amazonas”, disse.

SOBRE OS PARCEIROS

No Brasil, a USAID, a NPI EXPAND e a SITAWI Finanças do Bem se uniram para criar uma parceria para apoiar a Resposta à COVID-19 na Amazônia. Entre 2020 e 2021, a primeira fase do projeto do NPI EXPAND Resposta à COVID-19 na Amazônia distribuiu mais de 23 mil cestas básicas e kits de higiene, capacitou mais de 500 agentes comunitários de saúde, doou mais de 1,4 milhão de máscaras feitas por costureiras locais e divulgou mensagens educativas de prevenção para mais de 875 mil pessoas na região. A Fase está promovendo maior resiliência das comunidades amazônicas através do apoio amplo a vacinação contra a COVID-19, campanhas de informação e combate à fake News, e apoiando os sistemas locais de saúde na região com equipamentos e insumos para detectar, prevenir e controlar a transmissão de Covid-19, bem como realizar o acompanhamento de casos agudos de COVID-19 e tratar as sequelas de síndrome pós-COVID-19.

Fonte: FioCruz da Amazônia