Estudo avalia saúde sexual e reprodutiva das venezuelanas migrantes em Manaus e Boa Vista

Um estudo inédito, coordenado pela Universidade de Southampton, na Inglaterra, está sendo realizado no Brasil em parceria com a Fiocruz e Universidade Federal do Maranhão, com o objetivo de avaliar a Saúde Sexual e Reprodutiva das Mulheres Migrantes da Venezuela, em condição de vulnerabilidade social. No total, a pesquisa, denominada ReGHID, está acontecendo em quatro países da América Latina (Colômbia, México, El Salvador e Brasil), impactados pelo fluxo migratório de latino-americanos desencadeado em 2014, em função da crise socioeconômica e humanitária vivida naquele país. No caso do Brasil e Colômbia, o fluxo migratório de venezuelanas se dá pelo corredor Sul-Sul. No Brasil, a pesquisa é coordenada pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), em parceria com o Laboratório Território, Ambiente, Saúde e Sustentabilidade (LTASS), do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), além da UFMA, tendo como recortes geográficos as cidades de Manaus e Boa Vista.

Parte dos resultados do levantamentos quantitativos e qualitativos da pesquisa foi apresentada nesta terça-feira, 10/05, na sede do ILMD, para representantes de organizações não-governamentais que trabalham com imigrantes, a exemplo da ONG Hermanitos, de Manaus, a Agência da ONU para Refugiados no Brasil (Acnur), a Organização Internacional para as Migrações (OIM), Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa) e parlamentares do Estado do Amazonas, com a presença da coordenadora geral do estudo, Pia Riggirozzi, professora de Política Global da Universidade de Southampton.

A médica Maria do Carmo Leal, pesquisadora senior da ENSP/Fiocruz e coordenadora do inquérito no Brasil, explica que o estudo visa conhecer as dimensões e diferentes aspectos da vida sexual e reprodutiva desse público para, entre outras finalidades, traçar linhas de atuação que permitam a formulação de políticas públicas voltadas para elas, além de conhecer como se dá o processo de migração das mulheres e acolhida delas no Brasil. A pesquisa envolveu um universo de aproximadamente 2 mil mulheres, na faixa etária dos 15 aos 49 anos, que migraram para o Brasil entre 2018 e 2021. Elas foram entrevistadas ao longo de um ano, nas cidades de Manaus e Boa Vista, principais portas de entrada da migração venezuelana no Brasil, por mulheres também venezuelanas selecionadas e capacitadas para o projeto

Com financiamento do governo inglês, a parte quantitativa da pesquisa identificou índices de gravidez na adolescência, pobreza menstrual, métodos contraceptivos e questões como renda familiar, tipo de moradia, situação conjugal, escolaridade, entre as entrevistadas. Um dos resultados práticos do trabalho foi o fotolivro, que reúne fotos e descrições feitas pelas próprias venezuelanas de algo que caracteriza a vida sexual e reprodutiva delas e seus significados.  “A pesquisa é um trabalho colaborativo e novidade para nosso grupo, que trabalhou durante muitos anos a vida sexual e reprodutiva das mulheres brasileiras. Os dados começaram a ser coletados em meados do ano passado. Aqui em Manaus nos meses de junho e julho, e em Boa Vista, no mês de setembro”, enfatiza Maria do Carmo.

“São mulheres que migraram para fugir de uma crise socioeconômica humanística num país vizinho que vive um contexto de muita dificuldade, mulheres que deixaram os filhos, família, para fugir da falta de alimento, num processo que denominamos de migração forçada”, salienta a médica. Segundo ela, o estudo abre uma nova linha de pesquisa em saúde pública e apresentará subsídios impotantes.  A vice-coordenadora do LTASS, Rita Bacuri, reforça a importância do trabalho pela oportunidade que ele abre de diálogo com as autoridades locais nas cidades em que ele acontece. “Se conseguirmos contribuir com a elaboração de políticas públicas que possam atender essas mulheres já teremos dado um grande passo”, observa Bacuri.

A apresentação ocorreu na sede da Fiocruz Amazônia e foi aberta pela diretora do ILMD, Adele Benzaken.  “É importante dar voz a essas adolescentes e mulheres venezuelanas, como o projeto vem fazendo em vários países. A migração venezuelana é um problema recente no Brasil e essa iniciativa da professora Pia será de grande valia para redução das iniquidades em saúde para esse público que sofre estigma e discriminação, além da pobreza e da fome”.  A coordenadora geral da pesquisa Pia Riggirozzi destaca que o trabalho se encontra atualmente na etapa de fechamento de coleta de dados, a partir de todas as histórias de adolescentes e mulheres venezuelanas ouvidas ao longo de meses de pesquisa. “A segunda etapa do projeto será a de análises após a conclusão do trabalho de campo, feito por meio de diferentes modalidades de entrevistas (on line e individuais), nas quais se percebeu a necessidade que as adolescentes e mulheres venezuelanas migrantes sentem de falar e serem ouvidas”, afirmou.