Em artigo na LTr, magistrados do TRT11 analisam acesso à justiça no AM em tempos de pandemia

A publicação na revista jurídica ocorreu na edição de agosto deste ano e aborda a itinerância no interior do estado

Deslocamento de estruturas físicas e de pessoal em barcos regionais, cujas viagens duram dias pelos maiores rios do mundo. Voos em aeronaves de pequeno porte da década de 1970, em verdadeira “aventura” dentro da Floresta Amazônica. Esses são alguns dos desafios enfrentados por magistrados e servidores da Justiça do Trabalho durante as itinerâncias em municípios do interior do Amazonas para garantir o acesso à justiça aos cidadãos que ali residem. 

No artigo “Amazônia e acesso à justiça em tempos de pandemia”, publicado em agosto deste ano na revista LTr, os magistrados Sandro Nahmias Melo e Igo Zany Nunes Corrêa, do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – AM/RR (TRT11),  abordam o histórico da Justiça Itinerante no Amazonas e as peculiaridades regionais, que exigem adaptações do Poder Judiciário para garantir o acesso à justiça na região mais extensa do país.

A partir do método dialético com pesquisa descritiva de abordagem qualitativa do problema, os autores do artigo analisam  o direito fundamental ao acesso à justiça e a atuação das dez varas trabalhistas responsáveis pela jurisdição no interior do Amazonas, abrangendo um total de 61 municípios. Abordam, ainda, as adaptações feitas pelo TRT11 em decorrência da pandemia do novo coronavírus (covid-19), utilizando as tecnologias disponíveis para garantir o ajuizamento das ações e a realização da audiências telepresenciais, no contexto do Processo Judicial Eletrônico (PJe), apesar da exclusão digital em muitas localidades.

Eles defendem que instrumentos como a sólida itinerância trabalhista e o aperfeiçoamento contínuo do jus postulandi são ferramentas importantes na manutenção da acessibilidade dos jurisdicionados, embora enfraquecidos pelo momento de pandemia e isolamento vivenciados.

 

Direito fundamental

No artigo, os juízes do TRT11 explicam que não pode ser negado ao trabalhador habitante de região de difícil acesso o direito fundamental previsto expressamente na Constituição de 1988, através do princípio da inafastabilidade de jurisdição ou ubiquidade (art. 5º, XXXV). “Nem mesmo os entraves orçamentários, podem impedir ou inviabilizar o exercício do direito de acionamento do Poder Judiciário, conforme entendimento jurisprudencial consolidado da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)”, afirmam.

Dessa forma – acrescentam – trazendo para a realidade amazônica, tem-se que o direito de acesso à Justiça precisa se ajustar ao contexto dos locais situados nos mais distantes extremos do país, e não só isso, possam usufruir da tutela jurisdicional de forma justa e efetiva, dentro de um tempo razoável, não importando o esforço que o Estado tenha que fazer para que o fim seja atingido.

Eles abordam, ainda, o pluralismo étnico-social da região e a preservação do jus postulandi trabalhista, previsto no art. 791 da CLT que possibilita o ajuizamento, a defesa e o acompanhamento das ações trabalhistas pelas partes, independentemente de patrocínio por advogado.

 

Justiça itinerante

Mesmo diante dos muitos desafios e restrições orçamentárias, os autores apresentam dados da Corregedoria Regional do TRT11, segundo os quais no ano de  2019 foram ajuizados 1.384 processos, através da Justiça itinerante das dez varas do interior do Amazonas: Tabatinga, Itacoatiara, Coari, Manacapuru, Presidente Figueiredo, Eirunepé, Lábrea, Humaitá, Parintins e Tefé.

Como exemplo e por amostragem, eles destacam que na Vara do Trabalho de Presidente Figueiredo (município situado na região metropolitana de Manaus e com estimativa de 36.279 habitantes), no ano de 2020 foram ajuizados, até 1º de julho, 118 processos, dos quais 37 (31,35%) foram propostos via jus postulandi.

“Percebe-se, portanto, o grande volume de ajuizamentos por jus postulandi que justificam a manutenção do instituto, o qual, embora bastante criticado, serve de alternativa à ausência de advogados, assistência sindical ou defensor público nas localidades desestruturadas pelo próprio Estado”, observam.

 

Pandemia

Em decorrência da pandemia do novo coronavírus (covid-19), as medidas sanitárias adotadas no Amazonas em março deste ano restringiram o acesso entre as cidades, mesmo a partir da capital, tendo em vista a curva de contágio e a limitação de leitos hospitalares, com impacto direto também no acesso à Justiça.

Em cumprimento às medidas de distanciamento social,  o artigo salienta que magistrados, servidores e advogados  que atuam no TRT11 uniram esforços para garantir a realização de audiências telepresenciais, utilizando a videoconferência. A primeira audiência telepresencial do TRT da 11ª Região foi realizada pela Vara do Trabalho de Humaitá, no interior do Amazonas, em 4 de maio de 2020, ocasião em que  foi homologado um acordo.

Buscando reativar o ajuizamento de ações via jus postulandi, o Regional disponibilizou canais de atendimento por telefone e por e-mail das Varas do Trabalho do Interior do Amazonas, a fim de realizarem atermações pelos meios digitais, incluindo-se aplicativos de mensagem eletrônica.

 

Sobre os autores

Sandro Nahmias Melo é Juiz do Trabalho Titular da Vara do Trabalho de Presidente Figueiredo.  Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), é Professor Adjunto da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), atuando na graduação e no mestrado. É membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (cadeira 20) e Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 11ª Região — AM e RR (Amatra-XI).

Igo Zany Nunes Corrêa é Juiz do Trabalho Substituto do TRT da 11ª Região AM/RR. Mestrando em Constitucionalismo e Direitos na Amazônia pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Amazonas. É Professor Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. É Membro/Pesquisador do Observatório de Direito Socioambiental e Direitos Humanos na Amazônia  (ODSDH/AM).

 

Acesse o artigo na íntegra.

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