No Amazonas as mulheres ocupam um papel essencial no desenvolvimento econômico e sustentável do estado. Seja no Polo Industrial de Manaus (PIM), na ciência, na bioeconomia, no artesanato ou na gestão pública, elas inovam, produzem e transformam desafios em oportunidades.
Na Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Sedecti), as mulheres têm papel fundamental na formulação e execução de projetos que impulsionam o crescimento do Amazonas. Elas ocupam cargos estratégicos e lideram iniciativas voltadas à inovação, qualificação profissional e fortalecimento do setor produtivo.
A secretaria conta com três secretárias executivas que dão suporte ao titular da pasta, Serafim Corrêa: Sonia Gomes, secretária executiva de Planejamento; Ana Bessa, secretária executiva de Administração e Finanças; e Tayana Rubim, secretária executiva adjunta de Relações Institucionais. No total, a Sedecti é composta por 147 mulheres, sendo que 31 delas ocupam cargos de chefia.
Uma das principais vozes femininas na gestão pública da Sedecti é Sonia Gomes, 64 anos, que atualmente lidera a Secretaria Executiva de Planejamento (Seplan). Graduada em Engenharia de Pesca e pós-graduada em Planejamento Governamental, Sonia iniciou sua trajetória no serviço público aos 22 anos, por meio de concurso público.

Para Sonia, a jornada das mulheres na gestão pública ainda é desafiadora, mas avanços significativos foram conquistados ao longo dos anos. “Quando comecei, existia uma grande desconfiança sobre a minha capacidade apenas por ser mulher e engenheira. Fui quebrando essas barreiras com meu trabalho e dedicação”, relembra.
O avanço na ocupação de espaços por mulheres é visto como um reflexo do compromisso da Sedecti com a equidade de gênero. “A Sedecti não discrimina e isso é perceptível. Aqui nos é dada a oportunidade, e o secretário Serafim mantém isso. Na verdade, ele até nos dá um empurrãozinho, e isso é muito importante, pois começa a igualar as posições, inclusive no âmbito salarial. No estado como um todo, até por uma questão de ser tabelado, já percebemos a igualdade”, acrescentou.
A valorização feminina também é perceptível no Governo do Amazonas como um todo, que tem ampliado a presença de mulheres em cargos estratégicos. “O aumento de mulheres participando dos cargos públicos é visível. Hoje podemos ver o governador Wilson Lima tratando com várias mulheres ocupando cargos de destaque”, pontuou Sonia Gomes.
No coração da Zona Franca de Manaus, por exemplo, 33 mil mulheres atuam na linha de frente da indústria, operando máquinas, liderando equipes e contribuindo para a produção de tecnologia, representando um total de 27% da participação feminina no PIM em 2024, de acordo com dados da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa).
A participação das mulheres no Polo Industrial tem variado entre 26% e 28% do total de empregados. Entre 2019 e 2024, os dados apontam um leve crescimento entre 2021 e 2022, quando o percentual de mulheres atingiu seu pico em 28,19%, seguido por uma estabilização nos anos seguintes.
A supervisora de produção da Moto Honda da Amazônia, Polyana Figueiredo, exemplifica essa ascensão feminina no setor. Com 17 anos de experiência na empresa, é engenheira mecânica e elétrica e possui mestrado em engenharia mecânica.
“Eu passava na frente da empresa e dizia: ‘um dia vou trabalhar aí’. Então eu comecei como especialista de qualidade, passei pelos diversos setores de produção, controle e hoje sou supervisora, coordenando uma equipe de aproximadamente 400 pessoas”, revela.
Ela destaca o apoio que recebeu da empresa para seu crescimento profissional e a representatividade das mulheres na empresa. “Eu estou muito feliz de estar aqui na Honda, porque é uma empresa que proporciona oportunidades para as mulheres. Hoje temos operadoras, engenheiras e até diretoras. É um desafio estar nesse ambiente corporativo, mas somos respeitadas e admiradas, pois trazemos alegria e acolhimento ao ambiente de trabalho”.
Polyana destaca como avanços em sua carreira o fato de ter contribuído para implantar as duas linhas de montagem mais eficientes e com a melhor qualidade da Moto Honda. “A gente consegue produzir a cada 19 segundos uma moto. Então eu fiz o projeto, ajudei a implantar e hoje faz parte da minha casa, hoje sou supervisora de produção dessas linhas, então é uma conquista muito bacana. Também foi um outro desafio representar a Honda no Japão, na Argentina, dando suporte”.
A força das mulheres
Além da indústria, as mulheres amazonenses também desempenham um papel fundamental na pesquisa científica e na bioeconomia. Uma delas é Ingrid Reis, a cientista que escolheu a biotecnologia como caminho para desenvolver soluções sustentáveis e inovadoras.
Ingrid Reis descobriu sua paixão pela ciência durante a graduação, ao pesquisar microbiologia e microrganismos com potencial para a saúde. Sua trajetória começou em 2005 como estagiária no Centro de Bionegócios da Amazônia (CBA), onde ajudou a construir a Coleção de Microrganismos da Amazônia.
Com mestrado e doutorado, tornou-se coordenadora do Núcleo de Bioinsumos, liderando projetos inovadores, como o Biobanco de Microrganismos e o desenvolvimento de bioinsumos para a agricultura. Atualmente, a Coleção de Microrganismos do CBA conta com mais de 3 mil isolados da biodiversidade amazônica, sendo um patrimônio essencial para pesquisas e aplicações biotecnológicas.
Além de representar a riqueza biológica da Amazônia, o banco de microrganismos serve como base para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras, promovendo a bioeconomia regional e contribuindo para soluções globais, como a recuperação de solos degradados e a produção de biofertilizantes.
Apesar dos avanços, ser mulher na ciência ainda apresenta desafios. “Estar em um ambiente historicamente dominado por homens sempre traz desafios. Mas as mulheres estão conseguindo se firmar nesse meio com muita competência”, afirma Ingrid.
Ela acredita que é necessário ter firmeza e voz ativa para conquistar espaço, mas que essa jornada também traz fortalecimento. “Ao ocupar esses espaços, mostramos que as mulheres têm muito a contribuir na ciência, na indústria, na gestão pública ou em qualquer área em que queiram atuar. E é fundamental que esse movimento continue a crescer”, reforça.
Incentivo às Novas Gerações
Para meninas e jovens mulheres que desejam seguir carreira científica, Ingrid deixa um conselho valioso. “Acreditem no potencial de vocês e não tenham medo de ocupar espaços. A ciência precisa das nossas perspectivas, da nossa sensibilidade e da nossa força”.
No setor de bioeconomia, as mulheres lideram negócios sustentáveis que impulsionam a economia local e agregam valor aos produtos da floresta. Pricila Almeida, fundadora da Amazônia Smart Food e da Ecomodular, tem se destacado ao transformar a cadeia do tucumã e a biomassa de açaí em alimentos como hambúrgueres, almôndegas e linguiças. Criadas em 2021, suas startups buscam inovar na bioeconomia amazônica, promovendo o desenvolvimento regional e fortalecendo cadeias produtivas sustentáveis.
Ela revela que a empresa foi criada em 2021 e hoje conta com uma equipe de dez pessoas diretamente envolvidas. Indiretamente, impacta pelo menos 50 trabalhadores em comunidades. Os produtos estão presentes em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, além de eventos internacionais como Anuga, na Alemanha, e a Expo Dubai.
Para Priscila Almeida, empreender na bioeconomia é um desafio que envolve barreiras estruturais, especialmente para mulheres. “Os desafios da vida feminina, especificamente, ainda são barreiras estruturais. O machismo é uma dessas barreiras. Existe uma certa resistência em aceitar a participação de mulheres em posições de comando. Isso está diminuindo com o tempo, mas ainda é muito presente”.
A força feminina no artesanato
No Dia Internacional da Mulher, a história de Délia Veloso, 62 anos, artesã da etnia Baré, reflete a força e resiliência das mulheres indígenas na busca por autonomia financeira e preservação cultural. Natural de Santa Isabel do Rio Negro, a 630 quilômetros de Manaus, Délia transforma a piaçava em bolsas, carteiras e decorações que são muito mais do que objetos: são a expressão viva de sua ancestralidade e um meio de sustento para dezenas de famílias em sua comunidade.
A jornada de Délia no artesanato começou por necessidade. Durante anos, a extração da piaçava era monopolizada por homens, que vendiam a fibra bruta para produção de vassouras em grandes centros. No entanto, sem oportunidades de renda, as mulheres da comunidade Campina do Rio Preto decidiram transformar a fibra em arte. “Nós não queríamos apenas vender a piaçava, mas dar a ela um valor agregado, criar peças que pudessem ser vendidas com um preço justo”, relembra a artesã.
Hoje, Délia faz parte das 447 indígenas cadastradas no Programa do Artesanato Amazonense (PAA), uma iniciativa do Governo do Amazonas que promove qualificação, exposição e comercialização de peças artesanais. Em 2024, o programa arrecadou R$ 6,4 milhões, um crescimento de 25,14% em relação ao ano anterior, garantindo que mais artesãos tivessem acesso a mercados locais e nacionais.
Com o apoio do Governo do Amazonas, por meio da Sedecti, as peças de Délia e outras artesãs ganham espaço em feiras e eventos, como a Feira Nacional de Artesanato e Cultura Indígena e o Shopping do Artesanato, em Manaus. “Se eu estivesse na minha cidade, talvez não tivesse essa visibilidade. Hoje, posso vender meus produtos com um preço justo e ajudar minha comunidade”, afirma.
Apesar dos avanços, as dificuldades ainda são grandes. A conciliação entre trabalho e vida pessoal é um dos desafios mais marcantes. “Muitas de nós tiveram problemas em casa. Os maridos não aceitavam nossas viagens para vender em feiras, e algumas foram abandonadas por isso”, conta Délia. Para evitar que outras mulheres enfrentassem a mesma situação, ela decidiu fixar sua residência em Manaus, onde compra os produtos das artesãs da sua comunidade e os revende, garantindo renda para todas.
Fotos: Bruno Leão/Sedecti