China enfrenta ‘nova Longa Marcha’, diz presidente chinês sobre guerra comercial com EUA

PEQUIM E WASHINGTON – À medida que a guerra comercial declarada por Washington contra a China se acirra, com novas tarifas e restrições em nome da segurança nacional afetando seriamente empresas chinesas como a gigante de tecnologia Huawei , a situação no país asiático se complica, afirmou o presidente do país, Xi Jinping , nesta quarta-feira.

Em uma viagem de três dias à província de Jiangxi, no sul do país, o líder chinês disse que população precisa se preparar para crescentes dificuldades, comparando o período atual à Longa Marcha, período da década de 1930 em que o Exército comunista liderado por Mao Tsé-Tung se retirou para regiões rurais para recuperar forças, até finalmente tomar o poder em 1949.

— Hoje, na nova Longa Marcha, devemos superar vários riscos e desafios nacionais e estrangeiros — disse Xi à agência de notícias estatal Xinhua, referindo-se à jornada de 1934-36. — Nosso país ainda está em um período de importantes oportunidades estratégicas para o desenvolvimento, mas a situação internacional é cada vez mais complicada. Devemos estar conscientes da natureza complexa e de longo prazo de vários fatores desfavoráveis em casa e no exterior e nos preparar adequadamente para várias situações difíceis.

A Longa Marcha foi uma jornada de cerca de 10 mil quilômetros empreendida por forças comunistas que fugiam do Exército nacionalista de Chiang Kai-shek. Depois de se reorganizar e eventualmente conquistar o poder, a Longa Marcha tornou-se um dos mitos fundadores da China moderna.

Na véspera, em um discurso em Jiangxi, Xi já afirmara a uma multidão que “agora há uma nova Longa Marcha, e devemos nos preparar para um novo começo”.

Além de incentivar o ânimo da população chinesa, os comentários evidenciam as dificuldades que os chineses podem vir a enfrentar no futuro próximo, à medida que o governo Trump intensifica a pressão sobre o comércio do país. Na semana passada, a animosidade aumentou quando Washington impôs severas restrições à Huawei, alegando razões de segurança nacional.

A proibição de que empresas americanas forneçam peças à Huawei — cuja implementação acabou adiada por três meses após pressão de empresas americanas — é um golpe potencialmente devastador para a companhia, e teve sérios impactos sobre as cadeias de fornecimento de tecnologia e os investidores. Várias operadoras de telefonia móvel atrasaram o lançamento dos novos celulares da Huawei nesta quarta-feira.

Os Estados Unidos são atualmente o líder mundial em inovação tecnológica, o que reforça tanto a sua economia quanto a sua predominância militar. Até recentemente, o país minimizava o desafio tecnológico apresentado pela China, cuja capacidade era considerada inferior. Após anos de investimento em pesquisa e desenvolvimento, contudo, empresas chinesas fizeram avanços impressionantes em várias áreas, incluindo telecomunicações e inteligência artificial, pondo em xeque a supremacia americana.

Há poucos sinais de que a guerra comercial vá arrefecer. Desde o último dia 10 de maio, quando Trump aumentou em US$ 200 bilhões as tarifas sobre bens chineses e tomou medidas para taxar todas as importações do país asiático, nenhuma negociação entre as partes foi marcada.

O governo Trump comunicou que considera agora colocar uma empresa chinesa chamada Hikvision em uma lista que limitaria sua capacidade de adquirir tecnologia americana, como chips e software. A empresa, que fornece equipamentos para a sempre crescente vigilância governamental chinesa, disse em um comunicado nesta quarta-feira que “nunca fez nenhum negócio que envolva a violação dos direitos humanos”.

Em um gestos que sugere um recado aos Estados Unidos, Xi visitou na segunda-feira uma mina de metais de terras raras na cidade de Ganzhou. Para alguns observadores, foi uma tentativa de lembrar Trump da influência que a China tem sobre determinados recursos. A China é a maior fornecedora global de metais de terras raras, utilizados em muitos eletrônicos.

Xi depois pediu à indústria que continue “intensificando esforços” para desenvolver terras raras, chamando-as de “recurso estratégico”. Em uma entrevista coletiva na quarta-feira, as autoridades disseram aos repórteres que não deveriam superinterpretar a visita, acrescentando que tratou-se de uma rotina.

De acordo com o jornal inglês Financial Times, das 10 maiores economias do mundo, os Estados Unidos atualmente só não têm mais tarifas do que o Brasil. As novas tarifas aplicadas por Trump podem levar a China a declarar-se defensora da abertura comercial e da globalização.

Fonte: O Globo