A ideia é defendida pelo diretor do Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), Fábio Calderaro. Em entrevista à Agência Brasil, Calderaro defendeu a criação de “vetores econômicos complementares”, de forma a usar as vocações naturais da região, decorrentes de sua biodiversidade.
“O que separa o Amazonas de outros países pan-amazônicos [países vizinhos onde há também áreas de floresta amazônica] é o fato de existir, há 53 anos em Manaus, um polo industrial consolidado. O problema é que não manufaturamos os insumos da nossa biodiversidade por lá. Produzimos eletroeletrônicos e motocicletas, mas não produzimos fármacos nem produtos de higiene pessoal ou cosméticos, obtidos a partir da biodiversidade da floresta”, argumentou Calderaro.
Segundo ele, essa é a “maior vantagem comparativa” da Amazônia. “O que temos de fazer agora é transformar essa vantagem comparativa da região em vantagem competitiva; é atrelar essa economia a uma política industrial”, acrescentou.
Lei da Biodiversidade
Na avaliação do diretor da CBA, seguir o exemplo da Zona Franca de Manaus, no sentido de concentrar essas indústrias em uma área, facilitará a fiscalização de toda a cadeia produtiva de produtos e insumos obtidos a partir da biodiversidade da floresta amazônica. “Ao mesmo tempo, vai gerar atividades econômicas que poderão beneficiar a população local”, acrescentou.
Calderado ponderou, no entanto, que para essa política ser bem-sucedida, alguns entraves terão de ser superados, em especial relativos a dificuldades para a obtenção de licenças ambientais, bem como para o cumprimento de algumas obrigações previstas na Lei da Biodiversidade.
“Essa lei da Biodiversidade [Lei13.123/2015, que tem como origem uma medida provisória de 2004] foi criada para proteger o país contra a biopirataria, mas acabou criando entraves à exploração sustentável de nossa biodiversidade”, disse.
Segundo ele, essa lei tem uma “base argumentativa satisfatória”, no sentido de prever benefícios para as comunidades tradicionais de onde o conhecimento foi extraído, antes de ser aplicado na cadeia produtiva.
“No entanto, ela obriga o empresário a fazer um levantamento que, na verdade, é um trabalho homérico: o de provar que nenhuma outra comunidade detém o mesmo conhecimento”, disse. “Isso resulta em insegurança jurídica, porque é muito difícil provar ou mesmo saber que nenhuma outra comunidade detém esse mesmo conhecimento e, por consequência, direito aos benefícios previstos na lei”, argumentou.
Licenciamentos ambientais
Calderaro critica as dificuldades pelas quais as empresas têm de passar para obter licenciamentos ambientais na região. Para ele, essa burocracia gera um “ambiente hostil” tanto para empreender quanto para desenvolver negócios na Amazônia.
“Há uma letargia dos serviços públicos. Por exemplo, para obter uma licença ambiental em Minas Gerais são necessários 50 dias. No Espírito Santo, 25 dias. Já no Amazonas são necessários quase 400 dias, em média. Isso acaba levando o empreendedor a trabalhar na ilegalidade, o que é ruim até para o meio ambiente”, acrescentou.
Centro de Biotecnologia
O Centro de Biotecnologia da Amazônia tem, entre seus principais objetivos, o de desenvolver novas tecnologias a partir de pesquisas integradas, que serão realizadas direta e indiretamente por uma rede de laboratórios regionais e nacionais.
Para isso, oferece suporte para as empresas de transformação e industrialização de produtos naturais em suas mais diversas aplicações, o que abrange desde produtos farmacêuticos, cosméticos e bioinseticidas para a agricultura, até as indústrias de alimentos, corantes, aromatizantes e de óleos essenciais, entre outros.
Atualmente o CBA desenvolve 26 projetos. Entre eles, Calderaro destaca o aproveitamento de resíduos gerados na Estação de Tratamento de Esgoto da Industrial para a obtenção de adubos, matéria-prima para a construção civil, e para a obtenção de surfactantes (detergentes), glicerol e biodiesel. “Pretendemos literalmente transformar lixo em luxo”, afirma.
“Esse projeto causará impacto direto nas áreas ambientais, com a diminuição de rejeitos lançados ao meio ambiente, e com o desenvolvimento de novas atividades econômicas a partir de produtos com alto valor agregado”, diz o diretor.
Outro projeto destacado por ele é a chamada “produção de anticorpos”, que são usados para a fabricação de vacinas e kits de diagnósticos que hoje, no Brasil, são 100% importados. “No CBA temos uma plataforma de produção de anticorpos a partir de ovos de galinha, uma tecnologia de baixo custo e com capacidade de suprir a demanda nacional”, acrescentou.
Também de grande potencial é a iniciativa relacionada à recuperação de áreas degradadas, por meio da replicação de espécies nativas de interesse ambiental, e pela produção em larga escala de mudas sadias de interesse econômico, como o açaí, para indústrias alimentícia e farmacêutica; seringueiras, para a indústria da borracha; e bromeliáceas, para a obtenção de fibras para a indústria têxtil.