BRASÍLIA — Estados Unidos, Espanha, Equador e as 13 nações que integram o Grupo de Lima, incluindo o Brasil, sabiam, desde o fim da semana passada, que o autoproclamado presidente Juan Guaidó daria um passo mais largo na última terça-feira e convocaria apoiadores para protestarem nas ruas contra o regime do chavista Nicolás Maduro. Segundo fontes do governo brasileiro, o assunto chegou a ser discutido na sexta-feira, em Brasília, durante um almoço que reuniu representantes diplomáticos desses países. Trabalhava-se com a informação de que Guaidó já contava com apoio significativo dos militares venezuelanos, o que acabou não se confirmando.
“Não fomos pegos de surpresa”, garantiu essa fonte, acrescentando que Juan Guaidó tem mantido contatos frequentes com o governo brasileiro para fazer relatos sobre os últimos acontecimentos. Além do almoço dos diplomatas na sexta-feira, a situação na Venezuela fez parte da agenda de uma visita do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, a Washington na segunda-feira. Ao ouvir de autoridades americanas que a tese de intervenção militar na Venezuela havia ganhado força, o chanceler brasileiro teria defendido uma solução política e diplomática, mostrando quanto foi conquistado em apenas três meses para aumentar a pressão sobre Maduro.
Para pessoas ligadas ao tema, Guaidó temia que a Venezuela caísse no esquecimento, com “a ditadura voltando a ser encarada com normalidade”. Por isso, o opositor a Maduro decidiu criar um fato político na terça-feira, para reforçar os ânimos da resistência democrática e retomar a atenção do mundo para a situação do país.
— Assim como o povo venezuelano, Guaidó tem pressa, mas sabe que é preciso pensar no longo prazo. Ele é um político e não um general ou um guerrilheiro — disse outra fonte ouvida pelo GLOBO.
Essa fonte revelou que existe a expectativa de o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino, voltar-se contra Maduro, “mas não vimos nada de concreto ainda”. Outra informação, divulgada com alarde na noite de terça-feira pelos americanos e confirmada em Brasília, é que os generais venezuelanos teriam garantido ao governo brasileiro que Nicolás Maduro só não deixou o país, porque os russos o persuadiram a ficar. De qualquer forma, há otimismo quanto a uma ruptura no núcleo militar que apoia Maduro.
Enquanto acompanha os desdobramentos da crise na Venezuela, o governo brasileiro convive internamente com “um desconforto estrutural”, na visão de um experiente diplomata. Isto porque o Palácio do Planalto e o Itamaraty só conversam com a oposição, que são o próprio Guaidó e a Assembleia Nacional. Não há contatos com os integrantes da equipe de Maduro — à exceção dos militares, que mantêm algum diálogo com seus pares venezuelanos. Os funcionários da embaixada do Brasil em Caracas, por exemplo, estão proibidos de falar com o regime atual.
Isso teria se tornado um problema nas relações entre os palácios do Planalto e do Itamaraty e a área militar. De acordo com uma fonte que teve acesso à reunião de emergência convocada na terça-feira à tarde pelo presidente Jair Bolsonaro, ficou claro que não havia como apostar que havia chances reais de Guaidó contar com apoio de militares importantes, com patentes elevadas, para destituir Maduro. O grau de certeza de um dos lados contrastou com a cautela dos generais presentes na reunião comandada por Bolsonaro.
Fonte: O Globo