Conscientizar professores, pedir a carteira de vacinação na matrícula escolar e até levar os vacinadores às escolas são iniciativas que podem ajudar a reverter o cenário de baixas coberturas vacinais na adolescência. Pediatra do Programa Nacional de Imunizações, Ana Goretti Kalume Maranhão participou hoje (10) da Jornada Nacional de Imunizações e defendeu que melhorar a articulação entre saúde e educação é um dos caminhos para elevar a proteção dos adolescentes.
“Vacinar adolescentes é um desafio em todo o mundo. Apesar de o adolescente se achar invencível e não buscar unidades de saúde, ele continua vulnerável a doenças imunopreveníveis”, contextualiza a pediatra. “É nessa faixa etária em que começam as viagens, as festas em ambientes fechados, a experimentação tanto sexual, quanto drogas e álcool. É a faixa etária que mais tem acesso às redes sociais e mais se influencia, e é também a faixa etária mais atingida pelas fake news”.
Todos esses desafios só aumentaram com a pandemia de covid-19, que causou o fechamento das escolas e afastou a população das unidades de saúde. Correr atrás desse prejuízo, defende Ana Goretti, passa por um maior envolvimento da escola na vacinação. “A experiência com outros países tem demonstrado que onde você tem as maiores coberturas vacinais é onde a gente tem a vacinação dentro do ambiente escolar”, diz ela, que reconhece as dificuldades de realizar isso em um momento de esforços concentrados na vacinação contra a covid-19. “Se o adolescente não vai à unidade de saúde, a unidade de saúde precisa fazer uma estratégia para ir ao adolescente”.
A pediatra acredita que materiais de divulgação direcionados aos professores são uma forma de levar o tema da prevenção para a sala de aula. “Um professor sensibilizado tem contato com as famílias e é ele que tem contato com os adolescentes. Não é que o professor vá abrir a caderneta de vacinação, até porque hoje ela é tão complexa que até o profissional de saúde fica um pouco confuso ao analisá-la. Mas que isso esteja na pauta dos nossos professores”.
Outra forma de incentivar a imunização é incluir a apresentação da caderneta de vacinação no ato da matrícula escolar. Ana Goretti explica que essa medida não significa impedir a matrícula de quem não está vacinado, mas, sim, criar uma oportunidade de conscientização diante da apresentação do documento. Dados mostrados por ela indicam que onde essa medida já está em vigor, como Paraná, Pernambuco e Espírito Santo, a cobertura da vacina para o HPV é maior que em outras unidades da federação que não adotaram a medida.
Considerada por Ana Goretti o maior alvo das fake news, a vacina contra o HPV está longe de atingir as metas do Programa Nacional de Imunizações (PNI) e da Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre os adolescentes de 11 a 14 anos, 66% das meninas e 36% dos meninos concluíram o esquema de duas doses, quando as metas são de 90%, no caso da OMS, e de 80%, no caso do Brasil.
Desde 2017, a vacina é recomendada para meninas de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14 anos. O Brasil é um dos 112 países que aplicam essa vacina e distribuiu mais de 50 milhões das 400 milhões de doses contra o HPV disponibilizadas no mundo. Mesmo assim, menos da metade do público alvo de meninas foi vacinada com duas doses no Acre (33,6%), no Amapá (46,2%), na Bahia (47,9%), no Maranhão (49,7%), Pará (43,9%), Rio de Janeiro (44,6%) e em Rondônia (43,1%). No caso dos meninos, a situação é bem mais grave, sendo o Paraná o único estado que aplicou as duas doses em mais da metade do público alvo, com 57,7%.
Pesquisadores que participaram da Jornada Nacional de Imunizações explicam que quanto mais cedo a vacina é aplicada, maior é a proteção desenvolvida pela criança ao longo da vida. No caso das meninas, eles desmentem uma fake news frequente: não é preciso esperar a primeira menstruação para receber a vacina. A proteção conferida pela vacina contra o HPV é importante em um cenário de alta circulação do vírus, que tem uma prevalência de cerca de 53% entre a população de 16 a 25 no Brasil.
Prevenir-se contra esse vírus é importante porque, além das verrugas genitais, ele está ligado a diversos tipos de câncer. Em todo o mundo, o vírus do HPV está relacionado a 569 mil casos de câncer cervical, 61 mil casos de câncer vulgar vaginal, 92 mil casos de câncer orofaríngeo, 48 mil casos de câncer anal e 34 mil casos de câncer de pênis. A vacina é uma ferramenta cientificamente comprovada contra essas complicações. Uma pesquisa realizada durante 12 anos na Suécia, com 1,6 milhão de mulheres, mostrou que as vacinadas antes dos 17 anos tiveram risco 88% menor de desenvolver câncer de colo de útero.
Fonte: Agência Brasil