Vice-premier italiano busca aliança eurocética na Polônia antes de eleições-chave

VARSÓVIA — Na sua busca por parceiros conservadores na Europa , o vice-premier italiano Matteo Salvini visitou nesta quarta-feira a Polônia . Ao lado do ministro do Interior polonês, Joachim Brudzinski, o chefe do partido ultranacionalista Liga disse que quer ver formada uma aliança eurocética para as eleições do Parlamento europeu do próximo mês de maio. Enquanto isso, afirmou, Roma e Varsóvia unirão forças em favor de “uma nova primavera da Europa” e do “renascimento dos valores europeus”.

Segundo Brudzinski, ele e Salvini conversaram, numa reunião a portas fechadas, sobre migração e segurança das fronteiras na União Europeia (UE). O tema é sensível e central nas tensões dentro do bloco europeu, fragmentado diante do avanço de plataformas nacionalistas e de extrema direita em diversos países, incluindo Itália e Polônia.

— A Polônia e a Itália formarão parte da nova primavera da Europa, o renascimento dos valores europeus — disse Salvini a jornalistas em entrevista coletiva ao lado do seu homólogo polonês após a reunião. — A Europa que se formará em junho nos impulsará, no lugar daquela que existe hoje e é dirigida por burocratas.

Salvini também se reúne nesta quarta-feira em Varsóvia com o líder do partido governista da Polônia, Jaroslaw Kaczynski, com quem também deverá abordar o seu projeto de nova aliança. O governo polonês é dirigido pelo partido eurocético Lei e Justiça (PiS), que também reclama seu direito de soberania e menos “intromissões” da União Europeia nos assuntos nacionais.

O mesmo tom é adotado por Salvini, que acumula os cargos de vice-premier e ministro do Interior na Itália. O seu partido, Liga, ascendeu ao poder no ano passado com uma forte campanha para barrar imigrantes vindos da África e expulsar os que já estão no país. Na sua coalizão governista com o antissistema Movimento Cinco Estrelas, ele vem assumindo a dianteira sobre o seu homólogo, o também vice-premier Luigi Di Maio, em relação a temas polêmicos, sobretudo a imigração e a integração europeia.

Não é a primeira vez que Salvini vai ao encontro de líderes de governo alinhados ao seu projeto ultranacionalista. Em agosto último, se encontrou em Milão com o  premier da Hungria , Viktor Orbán. Rasgando elogios mútuos, os dois fizeram da ocasião uma chance para aumentar a pressão,   numa frente conjunta, sobre os seus vizinhos para frear a chegada de imigrantes e refugiados vindos da África e do Oriente Médio.

Agora, a sua visita a Varsóvia, a convite de Brudzinksi, acompanha o reforço das atividades dos eurocéticos a fim de promover uma mudança nos ventos da União Europeia após as eleições de maio. Importante articulador dessa frente, Salvini mantém, na contramão, uma relação  conflituosa com outros líderes europeus — aos quais chama, pejorativamente, de “velha classe política” —, tal como a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Emmanuel Macron.

O italiano poderia tentar unir o bloco Europa das Nações e da Liberdade —  o menor dentre os que compõem o Parlamento Europeu, ao qual pertencem, entre outros, a sua Liga e também eurodeputados da Reunião Nacional, o maior partido de extrema direita da França —  com o grupo Conservador e Reformista Europeu  para criar uma única e poderosa força eurocética no Parlamento da UE. Este último grupo hoje inclui o PiS e membros do Partido Conservador britânico.

Tanto Orbán quanto Brudzinksi preocupam Bruxelas pelas suas políticas em relação ao Estado de direito e à imigração. Assim como o premier húngaro, o governo do PiS vem sendo acusado pelos seus oponentes dentro e fora de casa de levar a cabo uma guinada autoritária, sendo alvo de uma sem precedentes investigação pela UE.

Kaczynski, o líder do PiS, diz que a Polônia, a maior beneficiária dos fundos de infraestrutura da UE, deveria permanecer como membro do bloco, a que se juntou em 2004, mas quer reformas para transferir mais poder de Bruxelas aos governos.

— As eleições (de maio) vão mostrar se as vozes eurocéticas dentro da Europa estão em ascensão ou se a a ascensão foi contida por enquanto — diz Michal Baranowski, o chefe do escritório do fundo German Marshall em Varsóvia. — Ambos (Kaczynski e Salvini) gostariam de ver uma Europa que seja mais focada na soberania das nações europeias. Uma Europa de nações, e não uma Europa mais unida.

Uma união com o grupo de Salvini poderia garantir uma voz poderosa para o PiS no próximo Parlamento Europeu. Especialmente porque os conservadores do Reino Unido deixarão o agrupamento de conservadores e reformistas europeus após o Brexit. Mas o partido, ao mesmo tempo, tem tentado diluir sua reputação eurocética antes das eleições parlamentares polonesas. Concordou recentemente, por exemplo, em reverter uma lei criticada pela UE que forçou juízes da Suprema Corte a se aposentarem antecipadamente.

Edit Zgut, cientista política do Centro para a Europa da Universidade de Varsóvia, ressalva, entretanto, as visões contrastantes de Salvini e Kaczynski em relação à Rússia. Como a maioria dos conservadores poloneses, Kaczynski é profundamente desconfiado de Moscou, ao contrário da posição publicamente defendida pelo italiano. Essas diferenças poderiam ser oobstáculo a uma futura cooperação entre os dois lados.

— Salvini é um dos líderes mais abertamente pró-Kremlin na Europa, enquanto Kaczynski tem tentado mostrar o rosto pró-UE do PiS recentemente — diz ela.— Alguns das visões da Itália em relação à Rússia geram preocupação em todo o espectro político da Polônia.

Fonte: O Globo