Decisão foi concedida pelo desembargador Domingos Chalub para cumprimento imediato e mantém famílias que temiam nova reintegração no local
A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) obteve nova decisão favorável na Justiça do Estado para suspender decisão, proferida pelo Juízo da 3ª. Vara Cível da Capital, que determina a reintegração de posse da área conhecida como Beco Green Ville, no bairro Flores, na Zona Centro-Sul. A decisão foi preferida pelo desembargador Domingos Chalub, presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJ-AM), e vale como mandado de intimação, a ser cumprido, imediatamente, por oficial de Justiça.
Com a decisão, as cerca de 300 famílias que residem no local há 27 anos e temiam ser alvo de nova reintegração, na próxima semana, permanecem na comunidade.
A reintegração de posse começou a ser cumprida na sexta-feira (18), pelo Gabinete de Gestão Integrada (GGI), mas foi paralisada após impasse entre duas decisões judiciais conflitantes de primeiro grau. Três casas foram demolidas, segundo relato dos moradores.
Com duas decisões em vigor, uma favorável à reintegração, movida pela Construtora Rayol (atual Construtora Carvalho) e outra contra, impetrada pela Defensoria Pública, o GGI optou por aguardar uma decisão definitiva da Justiça e suspendeu a retirada das famílias da área. A nova decisão foi preferida pelo desembargador Domingos Chalub e atende ação assinada pela defensora pública Dâmea Mourão e pelos defensores públicos Rafael Barbosa e Thiago Rosas do Núcleo de Moradia da Defensoria.
Na decisão, Chalub ressaltou a legitimidade da Defensoria Pública para atuar no pedido de suspensão de liminar, na medida em que cumpre suas funções institucionais de utilizar todos os meios admitidos para resguardar os direitos dos hipossuficientes que representa.
“O Juízo de Direito da 3ª. Vara Cível da capital determinou o cumprimento da ordem de reintegração de posse, a ser realizada no Beco Green Ville, ordenando a retirada de todos os moradores, mesmo tendo conhecimento da concessão de medida liminar deferida pela Vara de Usucapião que suspendia a execução de qualquer medida expropriatória. As decisões conflitantes, por si só, geram instabilidade jurídica em razão de serem emanadas por Juízos de Direito de mesmo nível hierárquico, o que impõe cautela no cumprimento de medidas judiciais expropriatórias” diz o desembargador em um trecho da decisão.
“A não concessão do presente pedido de suspensão de liminar causará prejuízos à ordem pública já que poderá negar aos ocupantes do referido imóvel o próprio direito vindicado na ação de usucapião, sem a possibilidade de retorno ao status quo ante decorrente do cumprimento da ordem expropriatória”, complementa Chalub.
A liminar citada pelo presidente do TJ-AM foi concedida na quinta-feira (17), pela juíza Mirza Telma de Oliveira Cunha, da Vara de Registros Públicos e Usucapião da Comarca de Manaus, em uma Ação de Usucapião Especial Urbana Coletiva movida pelo Núcleo de Moradia da DPE-AM, para que seja reconhecida a consolidação da comunidade.
Em sua decisão, que suspendia a reintegração, a magistrada levou em conta os argumentos apresentados pela Defensoria que reforçam o direito à moradia e o princípio da dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição Federal, e considerou ainda que o direito à propriedade não pode, neste caso, se sobrepor ao direito à moradia.
“Ocorre que, diante da colisão entre dois direitos fundamentais neste momento – moradia e propriedade – a utilização do método da ponderação nos levará, neste caso, a limitação do direito à propriedade, em detrimento ao direito da moradia, numa tentativa de minorar o impacto social de um despejo de tamanhas proporções”, diz trecho da decisão.
A decisão liminar observou ainda os riscos à saúde das famílias, em caso de despejo no contexto da pandemia do novo Coronavírus. Para a magistrada, “o perigo de dano, por sua vez, é incontestável diante do risco de que aproximadamente 300 famílias venham ser despejadas de sua moradia, num momento em que passamos por uma das maiores crises sanitárias da humanidade, sobretudo diante do risco de contaminação e propagação do vírus do Covid-19”.
Decisão PSL n. 4008579-80.2020
Fotos: Florêncio Mesquita/ DPE-AM