Em tempos de pandemia, o trabalho desenvolvido com 624 indígenas venezuelanos da etnia warao, abrigados em seis espaços de acolhimento provisório da Prefeitura de Manaus, tem sido intensificado pelo Plano Emergencial de Enfrentamento à Covid-19, integrado por órgãos municipais, agências da Organização das Nações Unidas (ONU), Organizações da Sociedade Civil (OSC) e a 12° Região Militar. A ação é parte da atenção indígena que o município vem buscando oferecer, com apelos nacionais e internacionais, para cuidado a esses povos.
“Me espanta a completa falta de interesse e comprometimento do governo federal para com os povos indígenas, não cansarei de dizer. A Covid-19 ameaça a saúde dos nossos ancestrais, adoecendo e matando um povo vulnerável durante essa pandemia. Além dos nossos índios manauaras, estamos voltando também a atenção aos warao, um povo que acolhemos, passaram muitas dificuldades e não merecem ter que enfrentar mais uma”, disse o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, reforçando o apelo que tem feito para preservar a saúde e a história dos povos tradicionais da floresta.
Após o aumento dos casos do novo coronavírus, causador da Covid-19, em Manaus, os atores envolvidos no fluxo de atendimento aos refugiados traçaram estratégias para realocação de 569 indígenas warao, que antes viviam no abrigo do Alfredo Nascimento, zona Leste, atualmente desativado pela Secretaria Municipal da Mulher, Assistência Social e Cidadania (Semasc).
Todos foram realocados para cinco novos espaços de acolhimento distribuídos pela cidade (escolas e centros esportivos) adequados para acolhimento, apenas um abrigo se manteve no mesmo espaço, o situado no Centro. O objetivo foi evitar a transmissão da Covid-19 entre a população vulnerável de refugiados.
Os abrigos são assistidos por uma equipe multidisciplinar de técnicos da Assistência Social. O trabalho foi reforçado com a contratação de mais psicólogos, assistentes sociais, coordenadores de abrigos, cuidadores sociais e assistentes administrativos por meio de Edital de Credenciamento para Contratação Emergencial.
Alimentação
Nos cinco espaços de acolhimento, os indígenas recebem as três principais refeições do dia (café, almoço e jantar). De 2 de abril até o último dia 2 de junho, foram 108 mil refeições distribuídas pela Semasc. Desse total, 15 mil almoços foram doados pela Organização Internacional do Trabalho (OIM).
Somente no abrigo do Centro, os indígenas preparam suas próprias refeições, pois o espaço possui estrutura para o preparo da alimentação diária. Os 50 waraos que vivem no acolhimento recebem cestas básicas semanalmente pela Semasc. Em virtude da pandemia, a Cáritas Arquidiocesana realiza doação de proteína mensal para os acolhidos no abrigo.
Deitada em um dos beliches cedidos pela 12° Região Militar para os novos abrigos, estava a indígena warao Eudimary Mariano, 31 anos, que vive a mais de um ano no Brasil. Ela é uma das acolhidas no abrigo da zona Centro-Oeste.
No último dia 4 de junho, na hora do almoço, o cardápio do dia tinha duas opções: a primeira a marmita contendo macarrão, baião, um pedaço de cenoura e abobora, o acompanhamento carne e farofa. A segunda opção peito de frango frito, macarrão, arroz, cenoura, batata e farofa. “Esse é o tipo de comida que gostamos. Ela é boa e tem sabor”, disse Eudimary após degustar a primeira opção oferecida.
A equipe técnica da Semasc realizou rodas de conversas e escutou os acolhidos e suas lideranças para chegar em um consenso de cardápio que possa agradar a maioria dos indígenas, uma das exigências do Ministério Público Federal (MPF).
A Prefeitura de Manaus também fez aquisição de fórmula suplementar para crianças de seis meses a um ano. O produto é um complemento da amamentação. Doações de fraldas de vários tamanhos foram feitas às crianças dos abrigos pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
A jovem indígena Nilda Pacheco, 18 anos, deu à luz a um bebê em território brasileiro. Hoje, seu filho possui oito meses de vida. “Gosto de viver no abrigo e é bom ter as refeições, principalmente para meu filho que faz uso do leite”, disse, ao amamentar o bebê se embalando na rede.
Nilda Pacheco é uma das sete integrantes da família de uma das lideranças warao mais influentes, no abrigo da zona Centro-Oeste. O cacique Rabel Aquilles, 43 anos, morava com toda família na rodoviária, hoje, ele e os familiares são acolhidos pela municipalidade.
Parcerias
A preocupação dos atores envolvidos no Plano Emergencial de Enfrentamento à Covid-19, com a higiene, principalmente em tempos de pandemia, intensificou a atuação de ações e parcerias. Kits de higiene pessoal contendo principalmente sabonete e shampoo são entregues pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) aos abrigos, além dos doados pelas Lojas Americanas aos idosos indígenas por meio da ADRA.
Os espaços também recebem o apoio dos Médicos sem Fronteiras (MSF) que montou estruturas para higienização das mãos com sabão nos principais pontos de circulação interna nos abrigos, e segue dando orientações de higiene e descarte correto de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos indígenas e servidores.
A organização humanitária internacional MSF já trabalha em seis abrigos para refugiados da etnia warao, onde realiza sessões de promoção de saúde, encarrega-se de atividades para garantir medidas adequadas de higiene para prevenir a transmissão e trabalha com vigilância médica para identificar pessoas com suspeita de Covid-19.
Manaus agora conta com o Centro de Isolamento e Observação para pacientes desse grupo vulnerável com casos mais leves de Covid-19. O espaço é fruto da parceria com MSF e foi implantado em uma escola municipal da zona Centro-Sul. O Centro de Isolamento e Observação conta com nove espaços restritos. Cada um comporta até dez pessoas da mesma família, dispondo de redes e estrutura para o período de observação da doença. No espaço, os pacientes indígenas contam com as três refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar), sendo o almoço doado pela Organização Internacional de Migração (OIM).
O ACNUR e o Unicef entregaram juntos 635 máscaras de pano aos indígenas, em meados de maio, visando as recomendações dos órgãos sanitários, além da doação de colchões com capas para todos os abrigos. As duas agências internacionais também distribuíram material informativo em espanhol e na língua warao, quanto aos cuidados com a higienização devido ao novo coronavírus.