A explosão de manifestações populares pelo país, no movimento que ficou conhecido como Jornadas de Junho, em 2013, coincidiu com a Copa das Confederações, um evento-teste para a Copa do Mundo. O que muitos qualificavam apenas como sinal de protesto contra a realização do Mundial, mais tarde se revelaria o marco da crise político-econômica que persiste no Brasil. Não bastasse o grito de “Não vai ter Copa!”, o último torneio que reúne as seleções campeãs de seus continentes escancarou problemas em obras de mobilidade urbana, estádios inacabados, com falhas de infraestrutura, e os gastos excessivos que já davam mostras do rombo nas contas públicas em prol do padrão-Fifa.
Antes mesmo do início da próxima edição, que começa neste sábado, a Rússia experimenta efeitos colaterais semelhantes com a Copa das Confederações, que tem exposto os países-sede ao escrutínio de todos os lados. Na quarta-feira, por exemplo, o Observatório Mundial dos Direitos Humanos divulgou um relatório apontando a exploração de trabalhadores russos e estrangeiros em obras da Copa. Obras, por sinal, que registram atrasos no cronograma e indícios de superfaturamento. É o caso da arena de São Petersburgo, onde a Rússia enfrenta a Nova Zelândia na abertura da Copa das Confederações. O projeto do estádio leva mais de 10 anos e já consumiu quase 5 bilhões de reais – o Mané Garrincha, em Brasília, arena mais cara da Copa 2014, custou aproximadamente 2 bilhões de reais. Mesmo com tanto investimento, o gramado teve de ser trocado em maio e não se sabe como resistirá ao ritmo de competição.
Dos 12 estádios previstos para a Copa do Mundo, apenas quatro estão prontos e serão utilizados na Copa das Confederações. Além dos percalços nas sedes e violações de direitos humanos, a Rússia ainda lida com a sombra dos cânticos racistas nas arquibancadas, que já resultaram em várias punições a clubes do país nas competições europeias, e a ameaça de confrontos entre torcedores. Na última Eurocopa, em 2016, ultras russos protagonizaram uma briga generalizada com hooligans ingleses, em que 35 pessoas saíram feridas. Os anfitriões radicais, inclusive, prometem ainda mais violência durante a Copa, sem se intimidar com o compromisso de atuação rigorosa que as autoridades russas firmaram diante da Fifa.
O contexto político, tal qual o Brasil em ebulição liderado por Dilma Rousseff durante a Copa das Confederações de 2013, também não se desenha favorável ao presidente Vladimir Putin. Ainda sem confirmar sua candidatura ao quarto mandato, em eleições previstas para março do ano que vem, o chefe de Estado russo enfrenta não só crises diplomáticas, como a acusação de intervenção no pleito norte-americano e as tensões geradas pela Guerra da Síria, mas também uma onda de protestos pelo país. Nesta semana, a polícia local prendeu cerca de 2.000 manifestantes, incluindo o líder oposicionista Alexei Navalny, que foi condenado a um mês de detenção. A todo momento, Putin repete que a recessão econômica no país acabou e reafirma a postura de combate à corrupção em seu governo, principal motivador das manifestações. Mais de 200 cidades registraram atos, como Moscou, São Petersburgo e Kaliningrado, sede da Copa do Mundo situada no enclave entre Polônia e Lituânia, fora das fronteiras russas, que desde 2010 tem se levantado contra o presidente.
Pressionado, Vladimir Putin espera que a Copa das Confederações aumente seu cacife político pelo êxito dentro e fora dos gramados. Mesmo não sendo um fã do futebol, o presidente fez cobranças à equipe local, que venceu apenas três de seus últimos 15 jogos. “Os torcedores que amam a Rússia esperam melhores resultados de sua seleção e que todos os jogadores assumam um compromisso total com o país, que joguem como verdadeiros guerreiros, ao menos com espírito de sacrifício e vontade de vencer”, discursou.
Sem o Brasil, maior ganhador do torneio, as atrações desta edição se limitam à campeã mundial Alemanha, que jogará sem suas principais estrelas, com média de idade inferior a 24 anos, Portugal, que conta com o astro Cristiano Ronaldo e, em outra prateleira, os bons conjuntos de Chile e México. Justamente por isso, o apelo do torneio diminuiu: apenas 70% dos ingressos foram vendidos. Tanto que a Fifa, pressionada por clubes como o Real Madrid, que vê sua principal estrela sacrificar parte das férias após uma temporada desgastante por uma disputa sem expressão, cogita abortar a Copa das Confederações como teste para a Copa do Mundo a partir do Catar.
No Brasil, embora tenha acumulado bons públicos, o evento abrigou seleções desmotivadas, que vieram ao país mais para passar férias que para competir. O título, por sua vez, acabou criando a falsa impressão de que a seleção brasileira estava pronta para a Copa de verdade, mas não foi capaz de desarmar a bomba-relógio das ruas que havia sido acionada por um torneio de futebol. Agora, os olhos do mundo se voltam para a Rússia – e, com poucos craques para distraí-los, devem enxergar um pouco daquele Brasil escancarado em 2013.
OS JOGOS DA COPA DAS CONFEDERAÇÕES 2017
FASE DE GRUPOS
GRUPO A
Sábado 17 de junho (12h): Rússia x Nova Zelândia
Domingo 18 de junho (12h): Portugal x México
Quarta-feira 21 de junho (12h): Rússia x Portugal
Quarta-feira 21 de junho (15h): México x Nova Zelândia
Sábado 24 de junho (12h): México x Rússia
Sábado 24 de junho (12h): Nova Zelândia x Portugal
GRUPO B
Domingo 18 de junho (15h): Camarões x Chile
Segunda-feira 19 de junho (12h): Austrália x Alemanha
Quinta-feira 22 de junho (12h): Camarões x Austrália
Quinta-feira 22 de junho (15h): Alemanha x Chile
Domingo 25 de junho (12h): Alemanha x Camarões
Domingo 25 de junho (12h) Chile x Austrália
SEMIFINAIS
Quarta-feira 28 de junho (15h): 1º colocado do grupo A x 2º colocado do grupo B
Quinta-feira 29 de junho (15h): 1º colocado do grupo B x 2º colocado do grupo A
TERCEIRO LUGAR
Domingo 2 de julho (9h)
FINAL
Domingo 2 de julho (15h)
Fonte: El País