Se aprovada, aborto de gravidez resultante de estupro, pílula do dia seguinte e até pesquisas com células-tronco poderão ser proibidos
De volta à pauta do senado, a PEC 29/2015, incluída na pauta da CCJ – Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, será votada na próxima quarta-feira, 8 de maio.
A proposta visa retirar direitos das mulheres no campo reprodutivo, abrindo a possibilidade da proibição do aborto em qualquer situação, ao alterar o artigo 5° da Constituição Federal para “… inviolabilidade da vida desde a concepção“.
Isso significa que, se aprovada, a PEC 29, de autoria do ex-senador Magno Malta (PR/ES), poderá proibir o aborto inclusive no caso de mulheres que engravidaram em decorrência de estupro, que correm risco de morte ou que geram fetos anencéfalos.
“A nova redação do artigo 5º poderá proibir a utilização de anticoncepção de emergência, mais conhecida como pílula do dia seguinte, e também alterará os processos da fertilização in vitro, pois embriões não poderão mais ser descartados”, alerta o Dr. Thomaz Gollop, coordenador do Grupo de Estudos sobre o Aborto (GEA) e membro da Comissão de Violência Sexual e Interrupção da Gestação Prevista por Lei da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO).
Isso porque, a inclusão do novo trecho reconhece o direito à vida desde o encontro entre espermatozoide e óvulo (fecundação), antes mesmo da implantação do embrião no útero (nidação).
“Este retrocesso na legislação levaria ainda mais mulheres a recorrerem a um aborto inseguro realizado em uma clínica clandestina, sem as mínimas condições de higiene ou profissionais qualificados, aumentando os já altíssimos números de mortalidade materna no país. Além do risco de morte, um aborto nestas condições pode trazer sequelas graves, como esterilidade, infecções, perfuração em órgãos e hemorragias”, explica o especialista.
A PEC e as células-tronco
Outra questão bastante importante, que está sendo omitida pelos responsáveis pela PEC, é o obstáculo que sua aprovação representaria para a ciência, mais especificamente para as pesquisas com as células-tronco.
As células-tronco são células que se dividem e se transformam, dando origem a outros tipos de células. Dentre as células-tronco, as embrionárias são as que possuem maior capacidade de gerar outros tipos celulares, sendo as mais utilizadas para as pesquisas científicas. Retiradas sobretudo de embriões descartados em processos de fertilização in vitro, estas células são a grande aposta da medicina para a cura lesões na medula ou doenças como osteoporose, doenças cardíacas, Alzheimer ou mal de Parkinson.
Com a aprovação da PEC 29, não seria mais possível o descarte de embriões, nem mesmo sua utilização para as pesquisas, pois a nova redação da Constituição tornaria estes embriões invioláveis. Também as mães que tenham uma gravidez que represente risco às suas vidas teriam de manter a gestação, pois o embrião, inviolável, seria tido como prioritário em relação à gestante.
Senado Federal x STF
Tanto o autor da PEC, o ex-senador Magno Malta (PR/ES), como os demais parlamentares favoráveis à sua aprovação, destacam que a intenção da proposta não é retirar os direitos já adquiridos, mas barrar as tentativas de ampliação da legislação, permitindo o aborto em outras hipóteses.
Independentemente da intenção do autor da PEC, a defensora pública Ana Rita Souza Prata, membro do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM), observa que, se aprovada a proposta, o artigo 128, do Código Penal, que estabelece as hipóteses em que o aborto não é punível, pode se tornar inconstitucional e, por isso, inaplicável.
“A partir desse entendimento, os abortos previstos nessas hipóteses, se realizados, gerariam responsabilização criminal às mulheres e aos profissionais que o realizassem.”
Há, ainda, a possibilidade desta PEC ser uma tentativa de ‘neutralizar’ ações do Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente no julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de número 442, que aguarda votação para a descriminalização da interrupção da gravidez até a 12ª semana de gestação.
Vale lembrar que o STF, em 2012, descriminalizou o aborto nos casos de grávidas com fetos anencéfalos.