CARACAS – O dia amanheceu na Venezuela com a maior parte do país ainda sem energia elétrica, na continuação da falta de energia que começou pouco antes das 17h locais (18h no Brasil) de quinta-feira, o pior apagão da memória recente de um país acostumado a repetidos problemas na rede de eletricidade.
O governo rapidamente atribuiu o apagão a uma sabotagem ou a um ataque sofisticado à usina hidrelétrica de Guri, a maior do país. Outras fontes de eletricidade não conseguiram compensar a falta de energia, incluindo unidades termelétricas no centro e no oeste do país. Com as luzes desligadas por 16 horas, a comunicação também se tornou um problema, com muitos celulares ficando sem carga na bateria.
A usina de Guri fornece eletricidade para o estado brasileiro de Roraima, que foi afetado pelo corte de energia e teve que ativar suas cinco termelétricas para não ficar sem luz. Em nota, a Roraima Energia, empresa responsável pela distribuição no estado, disse que o seu abastecimento era totalmente mantido por usinas termelétricas na manhã desta sexta-feira.
O governo de Maduro decidiu suspender o dia de trabalho e as aulas, “com o objetivo de facilitar os esforços para a recuperação do serviço de energia elétrica no país, vítima da guerra elétrica imperial”, tuitou a vice-presidente venezuelana, Delcy Rodríguez. Segundo relatos, mais de 90% da capital Caracas e 22 dos 23 estados no país não têm energia na manhã desta sexta-feira. A Reuters só conseguiu verificar que há energia elétrica em Puerto Ordaz, cidade na fronteira com o Brasil.
Apesar de cortes de energia serem cada vez mais comuns na Venezuela, devido ao colapso econômico dos últimos anos, um blecaute generalizado em todo o país é extremamente raro. Em 2013 houve uma queda de energia que afetou Caracas e 17 estados e durou seis horas, e em 2018 um apagão em oito estados durou 10 horas, segundo informaram as autoridades nas duas ocasiões.
O ministro das Comunicações, Jorge Rodríguez, insinuou que os EUA poderiam estar envolvidos no incidente, um comentário repetido pelo presidente Nicolás Maduro. O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, e o senador republicano Marco Rubio, da Flórida, zombaram das acusações e disseram que a culpa recai sobre a ineficiência do regime socialista e a falta de manutenção da rede elétrica.
“A guerra de eletricidade anunciada e liderada pelo imperialismo americano contra nosso povo será derrotada”, escreveu Maduro em sua conta no Twitter. “Ninguém vai derrotar o povo de Bolívar e Chávez. Máxima unidade dos patriotas!”
O líder opositor Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional que se proclamou chefe de Estado interino e foi reconhecido por 50 países, postou uma resposta em uma rede social: “Sabotar é roubar o dinheiro dos venezuelanos. Sabotagem é queimar comida é medicina. Sabotagem é roubar eleições. Em 2009 o regime decretou emergência elétrica e investiram US$ 100 bilhões e hoje seguimos sem luz, o país com as maiores reservas de petróleo do mundo”.
Rubio, um dos principais estrategistas americanos para a Venezuela, postou insistentemente sobre o assunto no Twitter. Já Pompeo reagiu dizendo que “as políticas de Maduro não trazem nada além de escuridão. Não há comida. Não há remédio. Agora falta energia. Em seguida, é Maduro que vai sumir”.
Na quinta-feira, as principais avenidas da capital ficaram engarrafadas e o metrô fechou, obrigando os passageiros a voltar para casa a pé. Os viajantes também informaram que as luzes se apagaram no Aeroporto Internacional Simón Bolívar, próximo a Caracas, o maior do país. Nas mídias sociais, os usuários relataram apagões dos Andes à costa caribenha.
Na noite de quinta-feira, Rodríguez, o ministro da Informação, disse à rede de TV Telesur que a energia foi restaurada em toda a região Leste do país, depois de um ataque “técnico e cibernético” contra o sistema de energia hidrelétrica de Guri. Ele disse que a eletricidade estaria de volta em todo o país em poucas horas, mas isso ainda não aconteceu.
— Aqueles que tentam de todas as maneiras provocar mudanças de regime na Venezuela continuarão recebendo a poderosa resposta do povo venezuelano — disse Rodríguez.
A estatal de energia Corpoelec afirmou anteriormente que a geração de energia elétrica na represa de Guri havia sido sabotada. A instalação no sul do estado de Bolívar, próximo ao Brasil, fornece energia a quase dois terços do país.
— Mais uma vez fomos vítimas de uma guerra elétrica. Desta vez, nós fomos atacados em nossa geração e transmissão de energia do estado de Bolívar, especificamente em Guri, a espinha dorsal de nossa energia — disse o ministro da Eletricidade Luis Motta na televisão estatal. Falando logo após as 18h locais, Motta disse que o serviço seria ser restaurado em cerca de três horas.
Blecautes e escassez de água tornaram-se uma ocorrência quase diária em toda a Venezuela, devido a anos de precariedade e má manutenção da infraestrutura nacional, que também sofre anos de má administração e êxodo de pessoal. As principais cidades ficam sem energia por horas a fio quase todos os dias.
A capital foi submersa na escuridão após o pôr do sol de quinta-feira. No leste de Caracas, onde fica a maioria dos bairros populares, os venezuelanos bateram panelas e frigideiras em protesto e gritaram “Maduro!” de suas varandas, como parte de um jogo no qual os vizinhos respondem com um palavrão.
Fonte: O Globo