Guaidó e opositores protestam em Caracas após represálias de Maduro contra deputados

CARACAS — O líder parlamentar Juan Guaidó saiu às ruas com apoiadores, neste sábado, em defesa da Assembleia Nacional venezuelana, da qual é presidente, após a investida do governo contra deputados opositores, como reação ao levante militar que tentou depor Nicolás Maduro.

As manifestações vão medir o nível de mobilização dos opositores depois do fracassado levante, que fez o regime de Maduro endurecer o cerco contra aliados de Guaidó, autoproclamado presidente interino da Venezuela desde 23 de janeiro. O braço-direito do líder opositor foi preso, três deputados precisaram se refugiar em sedes diplomáticas e outro fugiu para a Colômbia.

Vice-presidente da Assembleia Nacional, Edgar Zambrano, dentro do próprio carro, foi levado de reboque até a prisão por agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin). A pedido do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), a Assembleia Nacional Constituinte, criada pelo chavismo para minar a autoridade do Parlamento, suspendeu na terça-feira a imunidade parlamentar de Zambrano e outros nove parlamentares da oposição, acusados de traição e conspiração para depor o presidente.

“Neste sábado, vamos às ruas por nossa Assembleia Nacional”, a única instituição nas mãos dos opositores, tuitou Guaidó na noite de sexta-feira. “Por nossos deputados valentes que estão dando tudo e por todo um país que continua mobilizado até conquistar a liberdade”, escreveu.

Pelo Twitter, neste sábado, o líder opositor publicou um vídeo de um discurso seu na rua, em Caracas, e destacou que não será “com cárcere nem com guindastes” que o governo conseguirá deter o movimento. Mas ressaltou que, com isso, não queria minimizar a ofensiva contra a AN.

— Querem marcar, de maneira irregular, cassações de dirigentes para gerar medo. Este é o objetivo. É terror de Estado. É levar medo ao nosso coração para pensarmos que não podemos fazer mais nada — denunciou o líder, sob os gritos da multidão de “Fora Maduro”.

Guaidó destacou que tem investido na cooperação internacional e criticou a “intervenção de militares cubanos” na inteligência do país.

— Estamos cada vez mais perto de construir a transição à democracia. Tenho certeza. Mas chegamos a um ponto sem volta. Chegamos a um regime desesperado que encarcera o vice-presidente do Parlamento nacional — disse o líder da AN, também em referência às ameaças aos outros parlamentares. — Estes deputados não deixaram um dia de trabalhar. Todos os dias nos levantamos com uma pergunta: o que mais fazer para que a mudança seja mais rápida? Que não descansemos um só dia até a transição, apesar das perseguições, do que pretende o regime.

No discurso, Guaidó lembrou de assassinatos de manifestantes e condenou o que chamou de “sequestro de Zambrano”.

— Muitos nos perguntaram: qual a linha vermelha? Até quando podemos resistir como sociedade? Quando não há luz, não há água… Para quatro milhões (de venezuelanos, que saíram do país), há muito tempo se passou da linha. Amanhã é Dia das Mães na Venezuela, e quantos de nós vamos poder estar reunidos em família? Quantos vão poder preparar frango, paella, as flores?

Por volta de 12h30, algumas centenas de pessoas se concentraram na Praça Alfredo Sadel, no Leste de Caracas. Também foram convocadas concentrações em outras cidades do país.

— Eu vim em apoio aos deputados da Assembleia Nacional, que está sendo destruída, sendo dissolvida — destacou a manifestante Daisy Montilla, de 69 anos, com a bandeira da Venezuela nas costas.

Daisy tem três dos quatro filhos no exterior em razão da crise do país. O comerciante Alexander Mendoza, de 30 anos, levava consigo também uma bandeira americana.

— É uma ofensiva (do governo) muito forte. Peço aos Estados Unidos que nos apoiem para a democracia seja restabelecida — disse ele, no protesto.

O articulador do levante

O herdeiro político de Hugo Chávez, que diz enfrentar um “golpe” da oposição sob ordens dos Estados Unidos, sobreviveu ao levante de 30 de Abril, estopim de manifestações que deixaram seis mortos.

Na sexta-feira, Maduro acusou seu ex-chefe de inteligência Cristopher Figuera de ser uma “toupeira” da CIA que coordenou a rebelião, em meio à campanha de represálias contra os envolvidos.

Figuera e 55 outros oficiais foram expulsos das Forças Armadas por um decreto presidencial.

A primeira confirmação da participação de Figuera veio de Washington. Na terça-feira, o vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, anunciou que as sanções contra ele foram canceladas como recompensa por apoiar a rebelião, um passo para inspirar outros líderes oficiais a imitá-lo.

A Venezuela reabriu nesta sexta-feira suas fronteiras com o Brasil e Aruba, fechadas desde fevereiro para evitar uma operação de ajuda internacional, liderada por Guaidó, que tentava mobilizar militares contra Maduro. Caracas manteve fechadas as divisas com a Colômbia e as ilhas de Curaçao e Bonaire.

Fonte: O Globo